sábado, dezembro 30, 2006

2006 já é mesmo uma velha história.



Ávidos pelo novo, já mandamos às favas tudo o que nos ocorreu e vimos em 2006. Ansiamos pelo novo, malucos pra saber o que nos virá pela frente. Talvez alguma utilidade tivesse em saber se nalgum dos dias em 2007 eu me pegarei rindo, feito bobo, contente. Se noutro vou pedir arrego e me sentir um cretino. Se noutro eu terei, enfim, a vontade de voltar a escrever algum novo romance.

De todo modo, sei apenas que em 2007 eu continuarei a precisar de muito açúçar pra enfeitar, afinal, esta merda de vida brasileira.

sexta-feira, dezembro 29, 2006

Pra encerrar o papo, neste longo e desajeitado ano.

Já nem sei o que me resta dizer. Que o ano foi, afinal, divertido. E que 2007 seja um tanto mais. Pra encerrar, um vídeo que eu nem sei já andei postando por aqui. Em todo caso, um clássico que a gente ouve várias vezes. The Animals e Don't let me be misunderstood.


Tenham um bom ano novo e não se esqueçam de prometer que, em 2007, terão mais a companhia dos livros, da poesia e da elegância. Neste mundo violento e sujo, desesperançado, queimado e estúpido, nos resta cuidar um pouco da gente mesmo, nos educando um pouco, nos levando a um tipo melhor de entedimento das coisas. Não vai mudar nada, nem nos fará mais felizes. Mas neste mundo sofrido, este é o nosso pequeno e possível refresco.

49

Houve um tempo que esta singela canção me era um verdadeiro hino. Tempos difíceis, é bem certo. Eu me apagava à idéia de que o violão me salvara. Ora, "tem nada não, tenho meu violão"... Era só correr, naquele momento de angústia, para os braços do instrumento e cantar qualquer velha modinha. Mas certo dia me roubaram também o violão e a canção perdeu o sentido. E os tempos ficaram mesmo difíceis. Naquela época, e ainda hoje, o violão é símbolo de toda redenção, de toda a resistência. E é imprescindível, para muitas ocasiões. Ouçamos Cotidiano n.° 02, dos abençoados Toquinho e Vinícius de Moraes.


Cotidiano n.° 2

Há dias que eu não sei o que me passa 
Eu abro o meu Neruda e apago o sol 
Misturo poesia com cachaça 
E acabo discutindo futebol 
Mas não tem nada, não 
Tenho o meu violão 

Acordo de manhã, pão sem manteiga 
E muito, muito sangue no jornal 
Aí a criançada toda chega 
E eu chego a achar Herodes natural 
Mas não tem nada, não 
Tenho o meu violão 

Depois faço a loteca com a patroa 
Quem sabe nosso dia vai chegar 
E rio porque rico ri à toa 
Também não custa nada imaginar 
Mas não tem nada, não 
Tenho o meu violão 

Aos sábados em casa tomo um porre 
E sonho soluções fenomenais 
Mas quando o sono vem e a noite morre 
O dia conta histórias sempre iguais 
Mas não tem nada, não 
Tenho o meu violão 

Às vezes quero crer mas não consigo 
É tudo uma total insensatez 
Aí pergunto a Deus: escute, amigo 
Se foi pra desfazer, por que é que fez? 
Mas não tem nada, não 
Tenho o meu violão... 

(Toquinho & Vinícius)

quinta-feira, dezembro 28, 2006

Nenhuma justificativa.

Para postar Elvis Presley nunca é preciso de qualquer justificativa. Sempre é bem aceito. No entanto, vale lembrar que este escritor quando jovem, bem jovem, ouvia um álbum duplo de Elvis, um tal de 50 Greatest Hits. Tinha eu uns cinco, seis anos. Lembro de ouvir e gostar de algumas canções em especial. Pareciam-me feitas para criança - eu gostava daquele barulho, daquela levada que já me fazia dançar e balançar a cabeça. Lembro-me de ficar deitado num felpudo tapete, a olhar, por horas, as capas, as letras, as informações todas. E, sobreduto, aqueles discos pretos, seu material, aquelas linhas... Eu buscava compreender como era possível daquela coisa sair algum som. Gostava um bocado de ouvir música. Numa vitrola vermelha que dobrava feito maleta.


Ouvimos Elvis, com Return To Sender e I can't help falling in love with you.

Justificativas.


Tudo o que tenho postado por aqui, desde a primeira semana, obedece em geral a algum critério. Sinto-me sem conforto quando penso em publicar algo que nem tenha relação a alguma outra idéia cotidiana. Mas desta vez, não há justificativa. Silvia Suradova, atriz tcheca, fez poucos filmes interessantes. Fez Kolya, que muita gente viu depois do Oscar de melhor filme estrangeiro. E que, confesso, não vi. Mas uma certa foto da atriz me convenceu a fazer a última capa deste ano com a sua imagem. Que afinal, como bem se pode ver, é realmente bela. A República Theca deve estar repleta de claras imagens.

Redefinição e 2007.


Este blog nasceu num momento em que eu vivia uma fase de tédio e introspecção. Deveria servir, em todo caso, para que eu pudesse publicar meus velhos textos, entre meus dramas e músicas. Mas nunca me senti exatamente certo sobre tudo isso. Sei bem que eu não queria criar um blog do gênero "provedor de conteúdo", tal qual os brilhantes OMEDI e Rapadura Açucarada. Não me interessa a novidade, mas justamente aquilo que anda longe da lembrança da maioria dos internautas.

Este blog, afinal, me serve como um diário. E assim continuará. Mas algumas novas medidas serão tomadas, para que eu mesmo não me encha com essa coisa toda. Pra começar, haverá a participação de mais gente. Seja na escolha dos vídeos, seja na sugestão de imagens. Farei também uma seção de entrevistas semanais e sugestões de filmes que passarão em algum canal de tv a cabo. Quando há seções definidas, mais facilmente encontro as palavras.

Assim eu gostaria de ter 2007. Mais gente. Mais novidades. Mais mundos se colidindo. Ando meio farto de mim, como sou. Foram dois anos longe dos palcos, dos ensaios, das broncas de algum lunático diretor, longe das platéias pequenas e das conversas na pastelaria, na frente do teatro.

E mais me entristece a distância dos estudos. Preciso logo de outra faculdade que preencha o meu tempo, com novos assuntos e teorias. Assim eu quero o blog. Como quero este novo ano, mais inteligente e criativo. Que não seja apenas um eterno remexer num mesmo balaio. Vez ou outra a repetição de um mesmo manjar nos irrita.

quarta-feira, dezembro 27, 2006

Nova cara.

Este blog, caso o leitor perceba, está em reparos. Novo ano chega, nova cara terá. Nenhuma mudança drástica. Vou mexendo, até quando a paciência me deixar. E continuando a semana dedicada às canções que ouvi na discoteca de meu pai, o vídeo de Love Hurts, música para qualquer situação de entendimentos e apertos. E cujo solo de guitarra considero um dos melhores da história. E, afinal, Nazareth foi mesmo uma boa banda, não obstante o visual inexplicável de seu vocalista.

50

Chegamos à exata metade da lista elaborada em 2001, quando arrolei, segundo critérios dos mais subjetivos, as cem canções que mais me comoveram nesta vida ordinária. E "comoveram" conforme o sentido mais distante do termo, quando ainda era Latim, na boca de algum habitante dos campos romanos. Comovem, movendo-nos a algo, a soltar o corpo com profundo peso na cadeira, a assoviar absorto num vagão de metrô, a dançar feito o Pateta, a procurar por um cigarro, a respirar mais rápido, bem mais rápido.

A arte tem disso. Move-nos. Chegamos a não notar, visto que as exigências neuróticas da vida não nos permite. Mas quando ouvimos uma música que nos marca ou nos lambe os ouvidos, mudamos. Eu creio que até minhas pupilas cresçam, as mãos se molhem e a percepção de tudo acaba diferente.

A 50ª colocada, afinal, é daquelas canções de me fazer lembrar de uns tempos bem divertidos. Eu e outros malucos íamos a tudo o que é apresentação de Os Incríveis. Nos becos menos prováveis. Era começo dos anos 90. Eu cheguei ao disparate de conseguir, três vezes, os autógrafos de toda a banda. Mas que há? São músicos maravilhosos! O baterista Netinho, o baixista Nenê e o hoje falecido saxofonista Manito assinaram a capa de um raro disco que tenho. E deles é Minha Oração, primorosa versão de My Prayer. Uma canção que sempre me comove, a começar pelo pescoço: a minha cabeça sempre balança. E eu sempre acabo sorrindo.


terça-feira, dezembro 26, 2006

Irresistível.

Tara de minhas infâncias, Lucinha Lins cantava feito um sei-lá-o-quê de mistura de virgem florista húngara e sereia do mar Mediterrâneo. Vejamos Hollywood, postada há alguns dias. Melhor que ouvir, é ver e ouvir. Neste caso, especificamente.

Inútil retrospectiva. Inútil perspectiva.

O ano vai acabando e todo mundo começa a fazer das suas retrospectivas, arrolando todos os acontecimentos, desde os banais, os frívolos, aos trágicos, os espetaculares. Já nos dizia um velho psicólogo que somente é feliz quem tem a memória curta. Se me der na telha remexer nos arquivos, capaz de me lembrar de uma terça-feira negra, terrível, lúgubre, que eu tratei de esquecer logo na quarta, bem cedo. Ou posso me lembrar de uma palavra que me tenha sido dita em março, que eu tenha educadamente relevado. Ou de um fracasso que eu tive lá por agosto, numa tarde qualquer. Vai que me lembro de algum momento ordinariamente besta - agora, quando até me sinto bem humorado, ouço músicas velhas e mastigo alguns drops.

Caso alguém se interesse, estou a ler Pinóquio, de Carlo Collodi. Em alguns dias, farei alguma vaga observação. Por ora, ouçamos outra boa coisa que havia na discoteca de meu pai: The Archies, com Sugar Sugar.

Outra.

Outra da discoteca de meu pai, a bela Where Have All The Flowers Gone?, do escorpiano Johnny Rivers. Aliás, meu pai ouvia cada coisa bacana. Depois que envelheceu passou a ouvir cada tralha sonora! Me chega a ser incompreensível. E não me venham com a conversa de relativismos e preconceito. Mesmo as porcarias de antigamente eram melhores. Hoje a porcaria se engole entalada na garganta. Demora a descer pelo estômago.

Tom Jones ocupado.

Não sei ao certo, mas o sujeito que postou praticamente todos os vídeos de Tom Jones no Youtube não permitiu o embed, ou seja, não permite que blogs o publiquem. Pode apenas ser visto na página do Youtube, o que impede que milhões ou meia-dúzia possam melhor conhecer a arte de um dos mais simpáticos artistas da música pop. O que se passa na cabeça do sujeito é um grande mistério. Pra quê regular o que é realmente interessante? E como a minha preguiça natalina é absoluta, não procurarei por alternativas. Ouçamos outra coisa agora. Prometo, ao menos, manter o nível.

Pra começar, a obra-prima da descontração, Raindrops keep falling on my head, dos elegantes compositores Hal David e Burt Bacharach, na interpretação devida, com BJ Thomas, outro sujeito que conheci pela discoteca de meu pai.

segunda-feira, dezembro 25, 2006

51

Acreditem ou não, considero a canção Hollywood, uma das mais belas e inspiradas canções de Chico Buarque, o artilheiro maior da poesia brasileira. Ouçamos a balada, com a voz sensualíssima e límpida de Lucinha Lins e as vozes dos nossos quatro heróis de um extinto talento brasileiro: o Humor. Depois da queda do grupo Os Trapalhões, poucos são os programas efetivamente engraçados. Havia um tempo em que Chico Anísio, Ronald Golias, Moacyr Franco, Jô Soares, Renato Aragão e Renato Corte Leal estavam todos na televisão, ocupando todos os dias da semana. Havia muito humor de bobeira, mas havia também uma velada crítica ao modus operandi brasileiro. No cinema, havia a lembrança de Oscarito e Mazzaropi, havia a marca de Grande Otelo e havia a acidez do mestre maior da comédia cáustica, Zé Trindade, o homem que mostrava o Ridículo que neste país existe.

O humor de hoje é bem comportado, respeitante aos sabores do capital e da publicidade. Puro entretenimento. Personagens, em geral, mal vestidos. Atualmente, o humor televisivo se salva graças ao talento de grandes atores, como Marco Nanini e Pedro Cardoso. Tudo anda mesmo muito chato nesta arte de fazer os entediados rirem.

A tal música, ocupante da 51ª colocação entre as cem prediletas deste sujeito, afinal, me lembra de um tempo e de um cinismo bem diferente do que hoje há. Hoje apenas há um simulacro.




Hollywood

Ói nós aqui
Ói nós aqui
Hollywood fica
Ali bem perto
Só não vê quem
Tem um olho aberto

Ói nós aqui
Ói nós aqui
Hollywood
É um sonho de cenário
Vi um pau-de-arara
Milionário

E eu que nem sonhava
Conhecer o tal recife
Pobre saltimbanco
Trapalhão
Hoje sou mocinho
Sou vizinho do xerife
Dou rabo-de-arraia
Em tubarão

Ói nós aqui
Ói nós aqui
Tem de tudo
Nessa hollywood
Vi um índio
Cheio de saúde

Ói nós aqui
Ói nós aqui
How do you do
Caruaru
I wanna see
Piripipi
Ói nós aqui

Ói nós aqui
Ói nós aqui
Camelôs, malucos
E engraxates
Aproveitem enquanto
O sonho é grátis

Quem há de negar
Que é bom dançar
Que a vida é bela
Neste fabuloso xanadu
Eu só tenho medo
De amanhã cair da tela
E acordar
Em nova iguaçu

Ói nós aqui
Ói nós aqui
How do you do
Banabuiú
I wanna buy
O paraguai
Hollywood
And me
Ói nós aqui (vixe!)

(Chico Buarque)

domingo, dezembro 24, 2006

Só por hoje.

John Lennon quis fazer e fez a grande canção natalina que se possa imaginar. Noite Feliz e Jingle Bell são maravilhosas; entre as nossas, Assis Valente fez uma obra de arte eterna, Boas Festas - uma canção um tanto triste, convenhamos, e por isso tão bela. Mas não há outra que seja nevrálgica quanto Happy XMas (War Is Over), canção que não se rende ao pieguismo humano, nem abençoa a todos, nem nos permite esquecer que somos todos um animal bem precário.

Apaixonado que sou por canções natalinas, não obstante as filosofias todas, postarei uma seleção das melhores que houver por aqui, na minha longa discoteca. Mas não agora. Em fevereiro ou março. Ou quando não houver mais resquícios de Papai Noel nas lojas da cidade.

Presente.

Um presente ao meu pai, aniversariante da semana, que provavelmente jamais verá este blog, levando-se em conta a hojeriza dos mais velhos a este treco maravilhoso que é a internet. Mas se por acaso visitar, verá esta semana um punhado de vídeos de seu cantor preferido, Tom Jones. Para mim, em seu gênero, Tom Jones vem abaixo apenas do supremo Elvis Presley, o homem que foi os "Beatles" dos homens solo.

Mas Tom Jones tem repertório e voz para merecer um vice-reinado entre os "cantores que cantam, dançam e gravam pérolas suicidas e pancadas entorta quadris". Abaixo, dois clássicos do pop, com It's Not Usual e She's a Lady. Obras-primas da animação humana. O ser humano às vezes fica bem animado.


Crônica Dominical

Comprei-me dois belos presentes. Dois documentários, um sobre a produção de A Night at the Opera, lendário disco do Queen, e outro sobre o meu guru da velha adolescência, Vinícius de Moraes. Dois presentes que são símbolos de uma bonança que eu sempre espero encontrar. Ademais, isso de presente não é coisa simples. Há muitos anos, um amigo precisava comprar um presente para a namorada. Tinha apenas alguns trocados e a moça, acostumada a certo luxo, não aceitaria qualquer bobagem de símbolos. Ele pediu-me ajuda e naquele momento eu era uma boa solução para os problemas desse meu apaixonado amigo. Disse-lhe que, na impossibilidade de se comprar algum caro badulaque, restava comprar algo que, mesmo barato, pudesse ser tomado como valioso relicário. Precisávamos de alguma velharia...

Permitam-me uma rápida digressão: comprar presentes é um dos grandes dilemas masculinos. Mulheres, em geral, gostam de bolsas, sapatos e perfumes. Ora! como nos é difícil escolher entre tantas coisas absolutamente iguais. E tem a tal da grana... tudo que nos parece bom é sempre caro! E ainda há a tal relação de medidas... Tudo é por demais subjetivo nesse mundo de agradar com objetos. Freqüentemente tenho me dado bem nesta arte. Mas jamais dou algo que também não agrade também a mim, nem que eu considere menor. Quando dou um DVD ou CD, o faço com o coração partido, tomado de certa inveja, pensando no presente que gostaria de ter comigo. Mas é até bom que seja assim.

... e velharias havia em algumas lojas ocultas, brechós e sebos empoeirados. E naqueles tempos, os sebos andavam mesmo mais empoeirados. Encontramos uma pulseira, levemente enferrujada e um anel sem pedra. Por algo que hoje seriam uns dez reais, tínhamos uma maltratada bijouteria. Limpamos a peça com vinagre e pasta de dente e embrulhamos com um bom celofane. O plano era de alguma maneira perfeito. E a moça, acostumada a certo luxo, não era frívola ou estúpida. Não gostaria, é bem certo, de um presente qualquer, dado sem interesse...

Outra rápida digressão: em geral, os presentes são péssimos. Ganhamos uma porção de coisas que não nos agrada. Sobretudo porque a maioria nem faz mesmo uma reflexão muito profunda sobre os nossos gostos. Dão, com doses altas de automatismo. Vivo a ganhar camisetas cor-de-abóbora e azul bebê quando o planeta todo sabe que eu somente gosto de camisetas brancas, absolutamente brancas. Hoje talvez seja o dia de eu abrir um pacote e... Ora, estou sendo ingrato. Tudo será bem aceito.

...entregou-lhe o presente, pouco antes da meia-noite. Disse-lhe palavras belas, juras e elogios. Estavam sós. Ela lhe dava um suéter - roupa de homem sério, conforme o imaginário lógico feminino. Ele segurou a respiração por uns segundos, deixou-se levar por uma emoção fingida e real, teve os olhos a beirar o vermelho e lançou, convincente: "minha vó deixou-me este presente... esta jóia que foi dela, quando casou-se com... o meu avô. Eu prometi a ela que a daria a mulher que eu amasse um dia... E me amasse tanto... E veria esta jóia, velha, que possui muito mais que noventa anos... que a veria como a prova de amor sincero e forte".

A moça recusou o presente. Por considerá-lo muito nobre ou prova de tamanho carinho, que ela mesma não merecia, por não ter no peito o mesmo tamanho amor. Disse-lhe ainda que ela estava apenas a procurar por uma relação que fosse boa, mas que não fosse a última. Ou algo parecido. Meu constrangido amigo não quis divagar sobre o acontecido. Balbuciou a palavra "vaca" diversas vezes e considerou, afinal, que a moça não merecia mesmo tão nobre presente.

Uns anos depois achou quem o aceitasse. E acabou casado.

sábado, dezembro 23, 2006

Ignore o Natal.

Grande bagunça em todo lugar. Gente se esbarra, lojas lucram, dinheiro se ganha e se gasta. Muita grana. Época de se festejar a boa sorte, afinal estamos todos ainda vivos. Sobreviver é o melhor motivo. Que comemorem então e comam um bom panetone. Eu, cá no meu canto, continuo sem entender esse ritual que reúne muita gente, mesmo os mais lúcidos da espécie.

52


Ocupando a 52ª colocação entre as cem canções que mais me comoveram nesta vida de desassossego, um jazz-boogie (mistura de Brubeck e Mingus e certo verniz de Miles Davis) que discretamente não foi notado por muitos ouvidos exigentes. Ora, quem daria bola para a canção da abertura de um desenho animado? Os preconceituosos, então, não notaram a pancada que é Spider-Man Theme, com lírica de Paul Francis Webster, ganhador do Oscar de melhor canção em 1953, por Secret Love; em 1955, por Love is a Many-Splendored Thing; e, em 1965, pela maravilhosa The Shadow of Your Smile.

Abertura da primeira série animada do mais carismático personagem de Stan Lee, o tema talvez tenha sido o meu "primeiro" jazz. Clássico pra dançar e ouvir, lembrando-se ou não das agrugas de Peter Parker.


Spider-man Theme

Spider-man, Spider-man, does whatever a spider can,
Spins a web, sweet surprize, catches thieves just like flies,
Look out... here comes the Spider-man
Is he strong? Listen bud; he's got radioactive blood.
Can he swing from a thread take a look over head.
Hey man, there goes the Spider-man.
In the chill of the night at the scene of a crime,
Like a streak of light he arrives just in time.
Spider-man, Spider-man friendly neighborhood Spider-man,
Wealth and fame he's ignored, action is his reward.
To him, life is a great big bang up,
wherever there's a hang up, you'll find the Spider-man!

sexta-feira, dezembro 22, 2006

Sucesso.

Sucesso mesmo fez este vídeo. Salvo engano, em 1984. Pessoas dançavam, imitando os gestos e a coreografia, em festas por todo o canto. Em verdade, pessoas chegavam a se vestir como Jackson. Acho que foi o exato momento em que a cultura POP encontrou o seu ocaso.

O Escritório, segunda parte.

Neste canto virtual do mundo, escrevo muito sobre mim mesmo. Porque já há gente que fale das outras coisas e porque, falando de mim, sei que trago idéias que a qualquer um podem bem servir. Sabemos bem como é. A Revista tem o nome que tem justamente por se tratar de uma incrédula e constante revisão dessa minha vida. Uma "revista", ora, como aquela dos guardas nos meliantes. Como aquela que a gente mesmo faz na nossa casa... em nossas gavetas.

Há alguns dias, escrevi uma crônica sobre o desarranjo do meu escritório, lugar em que penso pensar na coisas, tento escrever e compor meus versos e vejo uma porção de filmes, entre outras boas coisas. Estava um caos - um tanto imaginável a todos vocês, leitores limpos e organizados. Estava vergonhoso. Mas depois de alguns dias de férias e pouco gasto, tudo está como há meses não estava.

Este é o resultado do rápido esvaziamento - a distância do emprego e dos devaneios do sr. diretor, a distância daqueles trens, a ausência daquele eterno acordar cedo. Agora, longa é a tarde, entre muitos goles de café e os mesmos cigarros. Muita preguiça e sede.

quinta-feira, dezembro 21, 2006

53

Entre as grandes bandas brasileiras, Os Incríveis quase nunca é lembrado. Muitos, quando perguntados, citam sempre Secos & Molhados, Mutantes e Ira!. Os Incríveis não aparece no rol de muita gente, bem o sei. O que me é um tanto espantoso. Eclética e criativa, a banda sabia se apropriar do que havia de mais interessante na MPB, de Jorge Bem a Herivelton Martins. De Luiz Gonzaga à moderna canção italiana. Ouçamos O Molambo, clássico da Velha Guarda, repaginado com classe e humor.

O Molambo

Eu sei que vocês vão dizer
Que é tudo mentira, que não pode ser
Que depois de tudo o que ele me fez
Eu jamais poderia aceitá-lo outra vez
Eu sei que assim procedendo
Me exponho ao desprezo de todos vocês
Lamento, mas fiquem sabendo
Que ele voltou e comigo ficou
Voltou pra matar a saudade
A tremenda saudade que não me deixou
Que não me deu sossego um momento sequer
Desde o dia em que ele me abandonou
Voltou pra impedir que a loucura
Fizesse de mim um molambo qualquer
Ficou dessa vez para sempre
Se Deus quiser.

(Jaime Florence e Augusto Mesquita)

quarta-feira, dezembro 20, 2006

Além do muro.

Mesmo um daqueles caras adoradores de Iron Maiden pode bem ter coração. Lembro-me de um velho amigo, daqueles fãs de Black Sabath e Judas Priest, que um dia confidenciou-me: "Ben me faz chorar". Como eu sempre tive cara de compreensivo, muitos foram os que me fizeram confidencias do gênero. Mas era bobagem, porque se envergonhar da emoção que eventualmente uma canção piégas pode nos causar? Ben nem me parece exatamente piégas. E comove mesmo, de um jeito até deslavado.

55

Um pequeno apontamento, provavelmente inútil:

Era, se bem me lembro, 1989. Talvez fosse 1988 ou 1987. Não sei ao certo. Não possuia ainda dezesseis anos e todos os meus amigos bem se preocupavam cada vez mais com a modernidade, a moda e aquilo que a maioria haveria de seguir e gostar. Talvez para se aproximar das mais belas moças, talvez para se integrar ao mundo mais badalado, fútil e fácil. Todos queriam fazer parte daquele tempo, recusando tudo o que era considerado velho e marca de outras épocas.

Sintomaticamente, uma daquelas moças lindas, cheias de sardas e cabelos, tachou-me de "o museu". Algo como "Gérri Rodrian, o museu". Eu era aquele deslocado, com livros na mochila, vivendo na mais suave ignorância: nada me interessava que não fosse, como eles todos mo diziam, velho. Enquanto todos ouviam Erasure, eu queria mesmo Noel Rosa. Sempre fui um sujeito esquisito.

Não sei quando a minha anacronia começou. Mas a canção que mais me faz lembrar destes tempos é Saudade da Bahia, reunião de dois gênios da música mundial, Dorival Caymmi e Tom Jobim. Bem me lembro da primeira vez que a ouvi. Senti uma espécie de carga elétrica intelectual. como se eu estivesse pronto, mas ainda desligado, desconectado de uma rede inteligente que ainda hoje não consigo nomear. Como diria a antiga alegoria popular, "caira uma ficha". Na introdução da música, durante uns dezesseis segundos, eu já me sentia hipnotizado, abduzido... mas foi na audição das vozes de Tom e Caymmi que eu percebi que o mundo era maior, muito maior do que antes me parecia. Que a arte não era tão somente um exercício de frescor e retórica, apenas um punhado de gente fazendo um troço estranho que nunca terminava e se transformava tanto. Eu acordara, de repente. Via que eu era um daqueles privilegiados, um dos escolhidos pela ordem genética dos deuses.

Nunca mais eu tive paz. Passei a minha vida, depois, a procurar por esta tal ordem, por querer dela tudo o que pudesse ter. Lágrimas eu tive de Guimarães Rosa; risos ganhei de Swift. Outros me deram paz, quando paz eu já não tinha. Ora, eu compreendi o código! Eu desvendei esta maçonaria de vagabundos - giramundos, se preferirem. Todos os artistas são grandes vagabundos, no sentido mais epifânico do termo. E a fome que eu encontrei, busquei saciar com toda fúria esfomeada, devorando livros, poemas, sinfonias, elegias, gravuras, palavras, cores...

Todas as vezes que a escuto, sobretudo lá pelos oitenta segundos, bate-me um "não saber das coisas" e uma carência de velha virgem que me obriga a ter alguma tristeza, alguma desesperança. Eu não vim da Bahia. E nem teria saudade de Osasco e São Paulo, se distante estivesse. Nem deixei tanto "minha mãe aflita". Mas sofri daquela dor da saudade por um lugar que eu sei bem não existir, por um horizonte jamais visto ou imaginado.

Não sei ao certo se o leitor me compreende agora. Creio ser confusa essa analogia entre as bahias de cada um. Tenho a minha. Todos têm o seu locus amenus, o seu paraíso perdido.

Esta canção é marca daqueles tempos, em que eu era o museu, era o antigo. E, no entanto, nem por isso desprezado pelas belas moças, as quais me julgavam, ao menos, um sujeito diferente.



Saudade da Bahia

Ai, ai que saudade eu tenho da Bahia
Ai, se eu escutasse o que mamãe dizia
"Bem, não vá deixar a sua mãe aflita
A gente faz o que o coração dita
Mas esse mundo é feito de maldade e ilusão"
Ai, se eu escutasse hoje não sofria
Ai, esta saudade dentro do meu peito
Ai, se ter saudade é ter algum defeito
Eu pelo menos, mereço o direito
De ter alguém com quem eu possa me confessar
Ponha-se no meu lugar
E veja como sofre um homem infeliz
Que teve que desabafar
Dizendo a todo mundo o que ninguém diz
Vejam que situação
E vejam como sofre um pobre coração
Pobre de quem acretida
Na glória e no dinheiro para ser feliz.

(Dorival Caymmi)

terça-feira, dezembro 19, 2006

Atrás do muro.

Jackson e uma das maravilhas que fez para o povo dançar naquelas baladas em que a AIDS e combate ao cigarro eram ainda uma semente das tragédias que viriam para estes nossos tempos. Naqueles tempos nada era realmente sombrio - e mesmo o punk era infantilmente colorido. Mesmo Reagan e Gorbachev sempre me pareceram duas velhas estabanadas. Ouçamos Don't Stop Till You Get Enough e pensemos em como a pista fervia naqueles tempos de pouca roupa e vergonha.

57 não. 56.

Por motivos obscuros, a canção 57 não estará neste blog. E nem direi qual seria, pra não provocar a ira dos leitores. Mas como ocorrera com a canção 56, o irregular Goear está de bode, cospe as canções que eu quero postar. Talvez porque Vinícius de Moraes e o Hino à Bandeira sejam por demais complexos para os seus arquivos. Curiosamente, Elis Regina acaba de ganhar novo arquivo, no mesmo canto. Vá lá entender a tecnologia que sustenta esta coisa. Vai que o computador tem ouvidos sábios e não permite músicas que só uns três sujeitos ouvirão durante o ano. Pulemos a 57ª colocação e ouçamos a maravilhosa canção que ocupa o 56° posto entre aquelas que mais me comoveram nesta minha vida de bosta e açúcar.

Em sua penúltima aparição neste rol, The Platters e a assassina The Twilight Time, coisa para se sentir a morte a lhe sussurrar alguma coisa boa, bem elegantemente.



Twilight Time

Heavenly shades of night are falling, it's Twilight Time
Out of the mist your voice is calling, "Tis Twilight Time"
When purple colored curtains mark the end of day
I'll hear you, my dear, at Twilight Time.

Deepening shadows gather splendor as day is done
Fingers of night will soon surrender the setting sun
I count the moments, darling, til you're here with me
Together, at last, at Twilight Time.

Here in the afterglow of day
We keep our rendezvous beneath the blue
Here in the sweet and same old way
I fall in love again as I did then.

Deep in the dark your kiss will thrill me like days of old
Lighting the spark of love that fills me with dreams untold
Each day I pray for evening just to be with you
Together, at last, at Twilight Time.

(Morty Nevins, Al Nevins & Artie Dunn)

Haddon Sundblom


Circulava eu pela rede, em busca de imagens, quando deparei-me com uma página do American Art Archives, em que pude rever a obra de Haddon Sundblom, um gênio das ilustrações. Nem há muito o que se dizer. Simplesmente maravilhosa coleção de desenhos publicitários, os quais ajudaram bastante a Coca-Cola a dominar o planeta Terra.

O espírito natalino.


Não me empolgo. Em verdade, chego a me irritar com propagandas que exultam o tal espírito natalino e a priorização do consumo, seja ele de que tipo for. Não me empolga. Fico até mesmo desanimado. Isso de colocar luzes e árvores de natal pelo mundo... Tanto comércio, tanto comércio. Não fosse um decreto assinado pela minha dona, eu passaria a noite de natal em casa, jogando uma eletrizante partida de Winning Eleven e comendo tão somente o que como todos os dias. Nem ligaria a ninguém, desejando feliz qualquer coisa.

Do Natal, além dos clássicos filmes, como A Felicidade não se compra, obra-prima de Frank Capra, dos panetones (que deveriam existir o ano todo!) e dos felizes feriados, nada mais me interessa. E nem sou assim tão monstruoso pela minha condição de ateu inconformado. Apenas não me toca um rito que é pura sacanagem capitalista. Bah! Será que ninguém mais percebe o automatismo destas comemorações? Alguém logo que me dirá que "o símbolo redime" ou que é necessário ao homem buscar pelo ritual coletivo... Pois que seja. Mas realmente não me interessa. Vou aos encontros pelos outros, jamais por mim.

E nesta época do ano, como já comentei a alguns meses, fica em evidência novamente aquele belo fetiche de promíscuos e profanos: as senhoras Santa Claus. Não obstante o ridículo de uma imagem erótica entre o velho barrigudo Noel e a menina chaupeuzinho vermelho menos vestida, algo é inegável: as moças todas ficam belas, com este vermelho tão promíscuo e profano. As grandes lojas da cidade sabem muito bem disso tudo.


segunda-feira, dezembro 18, 2006

Feito um dos sete anões.


Que a Branca de Neve desta casa não me escute, mas Beyonce Knowles é mesmo do tipo arrasa quarteirões. Tem bela estampa e tem uma bela voz - um tanto clone de outros clones, além de um repertório pobre como a época em que vive... Hum, estarei sendo duro? Não sei ao certo, sou velho demais para gostar e novo demais para ignorar.

Beyonce é daquelas mulatas de matar dono de padaria, de parar a avenida e levantar roda de samba. Como naquela "morena boca de ouro que me faz sofrer, o teu jeitinho é que me mata...", que João Gilberto cantava no tempo de fartura da música brasileira, desvendando o arquétipo brasileiro da bela negra manhosa. Algo que hoje sobrevive na ginga de Elza Soares e na parte feminina de Ronaldinho Gaúcho.


Mas a morena por vezes embranquece, alisa os cabelos e muda o modo de se maquiar. Nos comerciais abaixo ela tanto me parece Shakira, quanto Monica Belucci. Todas belas e no entanto parecidas... E creiam, moças, neste homem: cabelo é bacana, de todo modo é. Belo pode ser de qualquer jeito. Michael Jackson, feito um sansão das raças, perdeu o que tinha de mais belo quando transformou o seu corpo. Tornou-se fosco e profundamente feio.



A Queda.


Alguns artistas têm seu auge num certo momento e depois restam como sombra. Ficam em verdade uns chatos. Roberto Carlos, por exemplo, foi gênio durante um tempo e depois ruiu. Uma pena que tenha conseguido duas obras tão distintas. Melhor, para a história seria (e não exatamente para a sua conta bancária) se tivesse calado, tornado-se uma lenda muda e reclusa. Mas cabe ao bom ouvinte ignorar a bobagem e se agarrar ao que é clássico. Tal observação vale para muita gente que já apareceu na música popular. Até Fábio Júnior pode assim ser enquadrado, nas devidas proporções críticas. Começou mesmo bem, com até alguma força - os mais velhos certamente se lembrarão daquela coisa meio cafona de cantar sentado, no palco do Globo de Ouro. Era quieto e enxuto. Mas acabou tornando-se um ridículo histriônico, brega até os ossos. E tantos outros tiveram um repertório piorado com o passar dos anos. Até mesmo Michael Jackson. Este começou bem demais. Era um artista alegre e profuso. Foi até um tanto inovador, sendo a um só tempo simpático e esfuziante. Mas o seu embranquecimento e o empobrecimento da cultura americana - ou seja, da cultura global - trouxe um... Bem, não nos preocupemos com o que é irregular. Apenas sei que hoje seria impossível o surgimento de um Tim Maia.

Ô saudosismo besta. Escutemos esta semana Michael Jackson. Espero que os mais jovens sempre saibam que por trás de todo medalhão há um passado digno. Seja ele Fagner, Phil Collins ou Michael Jackson.



Pra começar a brincadeira, Jackson Five e Lookin' Through The Windows. E, abaixo, I Want You Back.


Adeus ao Orkut.

Mesmo me sendo uma ótima ferramenta de comunicação, depois de muita chateação (e tudo o que eu não quero na vida é chateação), deletei minha conta no Orkut. Nesta vida de merda, algumas vezes nos vemos obrigados a ceder. A calar. A enfiar goela abaixo um punhado de contrariedades.

Mas é melhor calar. Neste momento eu seria capaz de dizer muito. E o momento agora é de silenciar e saber que há dias que devem ser esquecidos, a todo custo.

domingo, dezembro 17, 2006

Crônica Dominical

O congresso nacional é efetivamente um lixo. Nem o digo por causa de um certo aumento discutido esta semana. Esse deslize moral não é absolutamente nada, diante de tantas outras ofensas ao eleitor panaca. As insituições deste país, todas elas, são lixo. As pastas de dente vendidas aqui são lixo. mesmo as locadoras e lojas de qualquer coisa, em geral, são lixo. Os trens são lixo. Os ônibus, lixo. As agências bancárias e os estapafúrdios atendimentos automáticos são lixo. Os móveis que compramos, em sua grande maioria, são verdadeiros lixos, feitos para durarem por uns dois anos, no máximo. Nossos aparelhos de som são verdadeiras porcarias. A água que bebemos deve ser um lixo, mas não o afirmo com toda certeza, uma vez que jamais bebi água de outro canto do mundo. Nossa internet banda larga é um lixo tremendo. Nossas escolas são um lixo. Um lixo que produz gente ignorante e mais lixo. Até mesmo nosso asfalto é lixo.

Fico meio na dúvida se eu e mais os outros brasileiros são também lixo. Talvez sejamos todos. Lixo. Gente que reclama e nada faz, a começar por mim. Que seria incapaz de seguir adiante com algum protesto. Mas o que não cabe, não obstante a nossa fragilidade conceitual, é este eterno reclamar, prática tão bem digerida por aqui. E não há coisa que mais tenha me irritado nestes últimos tempos. Amigos reclamam de seus empregos. Reclamam da falta de tempo e vontade para o exercício do prazer. Reclamam das mulheres, da mesma maneira que as mulheres têm reclamado dos maridos. Todos a reclamar de tudo.

Reclamar é um direito, vá lá. Mas apoiando-se neste direito, todos nós deixamos de fazer, encontrar um novo meio, um novo caminho ou seja lá o que for. Fica-nos cada vez mais a máscara da frustração. Que isso acabe! Que comecemos a tomar atitudes, mesmo as mais descabidas, e deixemos essa masturbação inútil, sem gozo.

Que então todos deixem os espertos deputados. Deixem. Ou façam algo, gritem e matem um por um, até que alguns, pelo medo, tomem alguma vergonha na cara. Que sequestrem empresários ou os diretores banqueiros ou o secretário de transportes. Exijam o que nos é de direito, o que é melhor. Que alguns internautas descontentes explodam algum departamento da Telefônica ou da NET. Façam isso. Mas, por favor, acabemos com as reclamações que nada acrescentam.

Vivemos num baita lixo tropical. E é bem provável que este povo já abduzido pela ignorância e pela falta de esperança não tenha mais a menor vontade de lutar, procurar por melhores dias.

sábado, dezembro 16, 2006

O abnegado.


Vai acabando o ano. E todos já começam a enfeitar a árvore ou outra coisa que possa receber luzes, como o portão e a janela. Alguns compram presentes e outros os recebem. Eu mesmo me darei alguma coisa. Um sapato, talvez. Pra melhor pisar na velharia do mundo. Ou um novo par de óculos para que eu possa ver com mais clareza, sem névoa, o desassossego. Ou até mesmo um velho livro sobre um tal de Pantagruel. Um presente que me dê algum alívio, algum descanso. Talvez algumas horas de sono no hotel mais silencioso da cidade.

Ufa! Chega!

Semana cheia de controvérsias. Mas vai terminando bem, mesmo que haja ainda uma ou outra pendência... Mas a boa é que o nosso atrapalhado presidente da república finalmente sancionou o meu aumento, que já vale para o próximo pagamento. Ufa! Um saco de cimento simplesmente desapareceu de minhas costas. E aumento é um tipo de coisa que sempre cai bem.

O que não vai bem é brigar com... Bah! Deixemos agoras as rusgas e finalizemos logo a semana, que já estou um maltrapilho. E o fim desta semana traz De Olhos Bem Fechados.

Segundo a opinião deste e de outros cinéfilos, De Olhos Bem Fechados é o mais tocante filme de Kubrick. Sei que a comparação é difícil, mas é até bem fácil entender que se trate do filme que mais fala a cada um dos sujeitos na platéia. Afinal, o que faz Kubrick é descrever (e de modo algum explicar) o que ocorre dentro destas cabeças atadas a outras cabeças, atreladas pelo amor, pelo sexo, pela desconfiança, pelo ódio e pela carência. Cada uma daquelas situações e cada um daqueles personagens de Eyes Wide Shut é mesmo a metáfora ou a formulação onírica deste pânico mental, o qual nos guia por um tênue fio de nylon, entre poços de desejo, obrigações, honra e ilusão.

Como disse abaixo, não é fácil, e ninguém nos disse que seria. Mas Kubrick diz ainda mais: além de difícil, é incompreensível.



P.S.: não encontrei um bom vídeo de Laranja Mecânica. Que me perdoem todos. Todos.

sexta-feira, dezembro 15, 2006

Vez ou outra, o medo.

Quem já viveu o suficiente, sabe bem o que é ter medo. Aquele medo assustador de perder quem se ama. De voltar a caminhar procurando, feito um maníaco, pelo amor que preenche a nossa própria vida - que é de alguma maneira a razão desta própria vida. Medo de voltar a ter no peito um estrago que somente alguns anos podem ajustar - e ajustar, não curar. Ferida feia jamais se cura. É somente sobreposta por outras.

Que já amou como eu agora amo, sabe do quão é difícil recuperar a vida, depois de uma separação que não desejávamos. Alguns amigos, leitores deste blog aliás, já experimentaram desta detruição. Amavam, mas foram moleques, cretinos ou sei lá mais o quê. Passaram depois anos como autômatos, verdadeiros andróides de mágoa e arrependimento. E por quê? Porque somos todos profundamente desastrados, egoístas e, sobretudo, cegos. E magoamos aquelas criaturas que amamos... porque somos desastrados, egoístas... cegos.

Quem já passou por isso entenderá muito bem o que digo. Mea culpa, mea culpa. Não obstante a inutilidade que é reconhecer cada um dos erros que a gente já cometeu pela vida, sem procurar por desculpas ou amenizadores. Tal qual a história dos caras que queimaram pessoas. Qualquer justificativa será, ainda e certamente, um desaforo. Será um motivo ainda maior para ampliar e determinar a culpa. Danem-se os motivos. Erramos, fizemos merda, cagamos. Ora, que absurdo não perceber! Porra, será que é preciso ser muito maduro pra reconhecer que somos danosamente imperfeitos? Bem o somos, sempre. Eu, que já fiz bobagens, das mais diversas, e já gritei e perdi o senso, já falei o que não se diria nem em briga de assassinos; eu, que já cometi absurdos, por falta de pensar direito, de entender direito o que é essa difícil vida; "eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo, que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas, que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante"; eu verifico que 30 anos ou 60 não bastam para fazer de um moleque, um homem, no sentido mais íntegro do termo.

Porra! É difícil demais andar certo pelos caminhos, sem ridiculamente tropeçar nos tapetes, engasgar em palavras e conceitos que nos pareciam corretos; sem se sentir ridículo, humanamente ridículo. Arre, que nunca há arrogante que não encontre o chão, depois de um tombo que se poderia evitar, mas cujos olhos estavam voltados para o alto.

Quem já errou nesta vida, e comeu depois um prato de sopa que o próprio capeta temperou, sabe bem o que é o medo. Quem ama e recebe este mesmo amor em troca, dia pós dia, deve bem saber. Ou a qualquer hora, diriam alguns, será muito tarde. E a vida voltará àquela escuridão solitária.

Não é mesmo fácil. Mas não me lembro de ninguém ter dito que seria.

quinta-feira, dezembro 14, 2006

Tapas e beijos.

Diz a lenda que Ike metia um sarrafo na frágil Tina Turner. Mentira. Pura invencionice dessa gente que deseja sempre encontrar um monstro no pobre diabo apaixonado. Coisa da mídia pra vender revista. Parece-me que o tal Sonny também descia o braço na bela Cher. Ou teria sido ele o falecido de sei lá o quê, deixando a cantora viúva? Hum... Não sei ao certo e não é algo que bem me preocupe. Mas digo tal coisa pra que reflitamos quanto à condição desaforada dessa gente. Cantam juntos, compõem juntos, ganham grana juntos, vão a todas as paradas nervosas juntos, têm mansões juntos: e ainda conseguem brigar! Ora! Aqui em casa dá pra entender. O IPTU, o tédio profissional, os IPVAs, o devagar das conquistas... (Não, nada disso. Injustifiquemos sempre as malditas brigas. E sejamos divertidos mesmo na pindura e no fim-de-mês todo gastado na farra. Acalmemos os nervos, ó mulheres!) Mas casais apaixonados são mesmo bestas. Brigam, gritam, almadiçoam, cospem, arranham, apertam, agridem, desprezam-se, escaneiam-se e, logo mais, desejam-se. Gente estranha. Não sei se é o caso do povo citado acima. Nem sei se é o meu caso. Talvez. (Será o seu caso, leitor? Claro que será, se colocarmos uma certa condição para a pergunta: "de vez em quando"... Natural que seja. De vez em quando qualquer casal tem uma daquelas lascadas. Rusga de se dizer sandices e de se esparramar inocentes objetos pelo chão. Ora, de vez quando aparece uma merda que a gente sempre pisa sem querer. )




Ouvimos Ike & Tina, com os clássicos Proud Mary e River Deep, Mountain High. Coisa realmente boa.

Idéia atrasada.

Esta semana eu deveria, desde domingo, ter postados vídeos de clássicos casais da história da música pop. Mas a preguiça e/ou a falta de tempo não me permitiram. Começos hoje, então, com Sonny & Cher, e dois vídeos muito bons: Little Things e Little Man. Casal recheado de bons discos. Que, tal qual os outros casais que aparecerão por aqui, quando separado, rendeu bem pouca energia para a música moderna.


O Escritório.

A partir de conceitos freudianos, posso dizer que meu escritório é a parte concreta de meu intelecto. Quando confuso, confuso ele está. Quando calmo, calmo está. Quando qualquer coisa, qualquer coisa estará, pois é o real reflexo daquilo que se passa em minha mente. Muitos livros, discos, papéis, objetos e fotos. Tudo em desordem, restos de cigarros pelo chão, violões, pratos com resto de uva e xícaras em que bebi café, há alguns dias. Mas nem sempre é assim, confuso, feio. Por vezes fica orgazinado, limpo e eu posso encontrar o que quero, sem precisar revirar o entulho intelectual que agora há. Vejo alguns sapatos, algumas revistas velhas que eu já considero lixo, mas me vejo incapaz de efetivamente jogá-las em algum cesto. O próprio cesto, ao lado de minha mesa imunda, está repleto, transborda uns velhos papéis que identifico como pedaços de jornal.

Mas nem sempre é isso. Um escritório pós-tufão, pós-terremoto. Na maior parte das vezes recebo aqui os meus amigos. Falamos de tudo o que nos interessa, há tantos anos. Eles bebem de alguma bebida que eu mesmo não bebo, mas sempre as tenho, para os amigos tão somente. Fumamos nossos cigarros e ouvimos as boas músicas daqui.

Vez ou outra é a minha mulher que aqui me vem visitar, nesta minha caverna, protegida pelos olhos de um Elvis e por um grande quadro do Quarteto Fantástico. Mas ela vem pouco. Aqui é mesmo claustrofóbico... Digo, nem sempre é. Há vezes que aqui é o canto mais divertido da casa - uma verdadeira táboa de prazeres. Uma boa televisão, os canais da NET, uísque e cigarros. E um lugar para se cantar, no videokê instalado no PC. Aqui se canta Tu me Acostumbraste e Misery. Às vezes se canta Ziggy Stardust. Este escritório é um lugar de se ficar bobo.

Aqui eu escrevo minhas histórias, releeio meus poemas e, sobretudo, canto todas as canções que desejo. Aqui eu penso e desisto de pensar. E agora, engasgado de pensamento, vejo o escritório, extenção de minhas idéias, numa baguça dos diabos, sem que eu tenha a menor inteção de mudar alguma coisa. Ao menos hoje.

Sábado talvez.

Queimem-no! Queimem!

Um sujeito infeliz queimou um casal e o pequeno filho de cinco anos e ainda uma outra mulher. Queimou, como todo mundo já deve saber, dentro de um automóvel. Foi capturado e responderá o processo devidamente encarcerado.

É um exemplo de como há gente não merecedora de liberdade. O tal sujeito, pelo que li em algum jornal, já teve suas condenações, por crimes anteriores, e cumpriu tão somente um pequena parte da pena. Voltou a andar pelas ruas, desorientado e estúpido. E este mundo está cheio de gente que, efetivamente, não merece a liberdade. Não sou jurista e muito menos me preocupo com os ajustes que poderiam ser feitos na lei penal desta porra de país. Mas, decididamente, um pouco de criatividade nos faria bem. Um pouco de sadismo, até.

E digo isso não porque seja pouco humanista, mas por ser o contrário: sou daqueles que enchergam a vida com olhos grandes, que sente um enorme prazer com essa coisa de viver e gostar de coisas. E imaginar que de repente um desafortunado possa fazer mal a alguém que amo, ou mesmo a mim, que sou daqueles que não gostam de matar nem mosquito - simplesmente porque o sujeito teve a autorização de algum juiz para cumprir a pena em liberdade.

É o caso do tal Chapinha, ícone dos assassinos idiotas, que, por ser apenas uma garoto, segundo a lei vigente, poderá a qualquer momento repetir a dose com outro casal... Tudo isso é a inveja que faz? É a miséria? É raiva? Não deveria nos importar o que é. Não deveria servir, ao menos, de desculpa ou amenizar a pena de qualquer um. Mesmo porque uma coisa é roubar, outra é queimar gente viva.

*

A solução seria o desterro? Seria a pena de morte com enforcamento? A violência nasce no peito do sujeito, na sua profunda mediocridade. Na sua incapacidade de perceber que a liberdade é o bem maior nesta merda de sociedade desconcertada.

Ou como me diria um velho amigo: é a guerra! A guerra é contra o obscurantismo, contra a miséria humana. Uma guerra que vem sendo travada há alguns milênios e não parece estar chegando ao fim. Se sabe apenas que enquanto houver quem explore, haverá quem se revolte.

Enquanto houver gente, haverá merda. E quem dela se alimente.

quarta-feira, dezembro 13, 2006

Aquiles em Tróia.

Achilles, fabulosa animação de Barry Purves, vencedora de inúmeros prêmios, inclusive do BAFTA em 1996, conta em 12 minutos a história de Aquiles, na guerra descrita por Homero. Uma animação estupenda e tudo o mais. Mas somente assistindo, o nobre leitor saberá o quanto a parada é boa. A animação, abaixo, está dividida em duas partes. E quando der na telha, blogo mais uns vídeos desse sujeito indicado ao Oscar de melhor animação em 1993, por Screen Play, e em 1999, por Gilbert & Sullivan, The Very Models.



Grandes menores.



Outros dois trabalhos de Kubrick, os quais seriam supostamente obras menores se comparadas a um conjunto que tem 2001, Uma odisséia no espaço, Laranja Mecânica, Spartacus, O Iluminado e, sobretudo, De Olhos Bem Fechados, aquele que julgo ser o melhor filme dos anos 90 - imaginemos que maravilha seria se Kubrick tivesse vivido um pouco mais e o pudesse ter finalizado. E se pudesse ter dirigido AI - Inteligência Artificial, filme estupidamente estragado, que tem a curiosidade de ter os melhores 15 minutos iniciais da história da Ficção Científica, tendo todos os minutos restantes como os mais intragáveis. E que tivesse feito outras coisas mais, outras provocações.

Fellini e Hitchcock são outros que bem poderiam estar vivos. E Fritz Lang. E Glauber! Mesmo porque é evidente que o cinema passa por uma crise criativa. O efeito Matrix, resultado do efeito Pulp Fiction, vai perdendo a força. Não há conjunto, não há proposta estética inovadora, além daquelas que existem pela parafernalha tecnológica. Tudo anda desanimado. O cinema intelectual, experimental, está realmente chato. Ou forçosamente restrito. E são raros os filmaços, do quilate de Closer, do veterano Mike Nichols, e de Lost in Translation, de Sophia Coppola, dois exemplos de clássicos modernos, tal qual, em sua época, é clássico Casablanca.

Post Scriptum: vídeos de Dr. Strangelove e Full Metal Jacket.

Não sofra um derrame, pobre diabo.


De repente, não mais que de repente, todas as imagens deste blog, postadas nos últimos trinta dias, desapareceram! Que faço? Devo ser prudente e esperar, para que tudo se arrume mais tarde, sei lá como. Devo começar a gritar, dizendo mesmo toda sorte de palavrões cabeludos, imundos, ofensivos, grotescos? Devo calmamente, feito um paciente monge tibetano a plantar papoula, recomeçar, recolocar cada pequena imagem? Ou devo mesmo surtar...

Instantes depois...

Ufa! Estavam lá, as imagens. Voltaram também de repente, sem alarde. Bom. Seria insuportável tudo recolocar, quando há tanta coisa nova pra se fazer. E este episódio banal ao menos me trouxe uma certa reflexão: caso este blog entrasse em total desgraça, por problemas nos gigantes servidores do Blogger, eu teria paciência pra recomeçar? Teria ao menos paciência para reestruturar alguma coisa, recolocando vídeos, pesquisando pelas mesmas imagens, pelas capas...? Hum, bem creio que não, apesar do apreço que tenho pelo que já fiz por aqui. Em verdade, acho que alteraria toda a coisa, iniciaria um novo blog, com outro conceito, outra razão. Talvez um blog erótico e imundo. De muito baixo calão. Nele eu somente escreveria sobre essa infindável fodeção que há no mundo. Nada de Arte. Nada de nada. Só gente pelada e enlameada de suor.

E eventualmente imagens de lugares bacanas pra se visitar.

Mais Novak.

Vasculhando a rede, em busca de imagens de Kim Novak, encontrei um sítio "irado", como diria algum jovem deste país. Um sítio com centenas de capas de revistas, americanas, dos anos 20 aos anos 50. Pra quem gosta da arte, um prato cheio para pesquisa e degustação. Aqui, uma leve amostra, com as quatro capas que encontrei de Kim Novak. Mas há mais, muito mais.

Visitem então Vintage Movie Magazines. E percebam como há capas que justificam qualquer conteúdo. Aliás, há revistas que só valem mesmo pelas capas. Sempre é assim.

58

Alguns amigos me acusam de nacionalista, como se tal qualidade fosse afinal de contas um desaforo ao bom senso. Mas o sou, sim, pairando entre uma certa admiração e uma forte hojeriza. Um nacionalista consciente da mediocridade de sua gente, da fragilidade de tudo o que nos cerca. Creio eu, até, que a minha relação com a pátria seja a mesma com a arte sacra. Sou ateu, mas sou capaz de ouvir longas missas de Mozart e admirar cânticos dos mais diversos. Mesmo as igrejas me agradam. As considero belas, sem no entanto ser tomado pela misericórdia ou pela culpa.

Desta mesma maneira, gosto das bandeiras, brasóes, hinos e tudo o que possa remeter a esta porcaria de país. Sendo cético e amplamente descrente. Sem contaminar, no entanto, a apreciação artística. Dentre as obras do gênero, nenhuma me toca mais que o Hino à Bandeira, de autoria de Antônio Francisco Braga e lírica de Olavo Bilac.

Creio até que sou um dos poucos sujeitos deste país que escuta tal hino, ocupante da 58ª colocação entre as cem que mais me comoveram nesta desencontrada vida, como se ouvisse um som do Radiohead ou do John Coltrane. Ouço e canto, assovio. Nem penso em como tudo é um colapso, uma grande bosta enfeitada de açúcar... Um açúcar que nem dá pra todo mundo, bem o sei.

Obs.: ouçamos uma versão bem inferior, cuja interpretação desconheço, àquela que costumo ouvir, da Banda Nacional. Por algum motivo bizarro, não consigo levar tal versão ao instável Goear. Se eu conseguir, faço a substituição. A versão abaixo carece de certa virilidade.



Hino à Bandeira

Salve, lindo pendão da esperança,
Salve, símbolo augusto da paz!
Tua nobre presença à lembrança
A grandeza da pátria nos traz.

Recebe o afeto que se encerra
Em nosso peito juvenil,
Querido símbolo da terra,
Da amada terra do Brasil.

Em teu seio formoso retratas
Este céu de puríssimo azul,
A verdura sem par destas matas
E o esplendor do Cruzeiro do Sul.

Contemplando o teu vulto sagrado,
Compreendemos o nosso dever;
E o Brasil por seus filhos amado,
Poderoso e feliz há de ser.

Sobre a imensa nação brasileira,
Nos momento de festa ou de dor,
Paira sempre, sagrada bandeira,
Pavilhão da justiça e do amor.

(Antônio Francisco Braga e Olavo Bilac)

terça-feira, dezembro 12, 2006

Dois ícones.

Kubrick trouxe-nos ainda outros dois grandes ícones do cinema neste século XX. Spartacus, um herói que mobilizava a sua gente na luta pela liberdade, e Lolita, arquétipo de menina avassaladora e erótica, cujo poder destrói o pobre homem hipnotizado. Duas adaptações primorosas de duas grandes obras da literatura moderna. Aliás, valeria mesmo ler Spartacus, de Howard Fast, neste fim de ano... Lolita, de Nabokov, eu já tive o prazer de ler. Uma maravilha de livro. Sobretudo para um marmanjo sensato, uma vez que é impossível não se identificar com o bobo Humbert Humbert, um estúpido devotado à beleza da menina Lolita. Talvez porque saibamos que a tal Lolita vem às vezes de um jeito mudado, com outras idades, outras curvas. Vem até mais velha. Mas vem sempre, inexoravelmente, menina.

Manet em dezembro.

Vez ou outra sou tomado pela preguiça. Que parece subir pelos pés e vai rapidamente atingindo toda e qualquer parte de meu corpo. Vez ou outra sou tomado pelo tédio, que vai entrando pela boca, pela língua. E me traz sempre uma meia tontura... Vez ou outra sou tomado pelo mau-humor. Por um péssimo humor que eleva em mil o meu pessimismo. Entra pelos meus olhos, que chegam a arder, feito um sono dolorido.

Mas agora sou tomado por aquela sensação quase diária de inquietação e impaciência, como se eu percebesse que a cadeira me prende e me regula os movimentos... O ar bem rarefeito e seco, o cheiro de papel, o cheiro estagnado de repartição... E as idéias que pululam e nascem já castradas, vão direto para o cesto de lixo, aqui ao meu lado esquerdo.

Impaciência pode levar o sujeito ao caos. Sobretudo quando nos vem à mente alguma velha e boa memória de alguma praça, de alguma companhia que adorava praças. Ou quando me surge a imagem de um frescor ausente... este lugar é a antítese de qualquer frescor. É um emprego apenas. Em que o pobre escritor arruma a vida. Mas desarruma aquele sentido de viver entre árvores, feito gente mesmo. Não como um autômato sem oxigênio, sobrevivendo ao ar-condicionado pouco eficiente.


Manet, Édouard Manet. Suas imagens me vieram agora. Numa tentativa tosca de acalmar os sentidos... Não acalma. Nem Manet, nem Renoir, nem ninguém. Sou mesmo um sujeito paciente, que leva a vida sem grandes conflitos, trabalhando sem muito reclamar. Mas é esta ausência de vento, ausência de graça, ausência de odores agradáveis - que me torna, afinal, um efetivo inconformado.

Paciência, homem. Paciência!




E caso o leitor se encontre neste mesmo estado de "ranger de dentes", que veja algumas obras de Manet. Para pensar e, de alguma forma, imaginar que uma tarde, agradável como esta, poderia ser bem mais vivida. Ou vívida.

59


Ouçamos agora o sempre certeiro David Bowie e uma de suas belas interpretações. Sorrow está naquele espetacular lado B de Pin Ups, álbum fundamental na discografia de um artista também fundamental para a história da música moderna.



Sorrow

With your long blond hair and your eyes of blue
The only thing I ever got from you
Was Sorrow - Sorrow

You're acting funny, try to spend my money
Out there playing your high class games
Of Sorrow - Sorrow

You never do what you know you ought to
Something tells me you're the devil's daughter
Sorrow - Sorrow

I tried to find her cause I can't resist her
I never knew just how much I missed her
Sorrow - Sorrow

With your long blond hair and your eyes of blue
The only thing I ever got from you
Was Sorrow - Sorrow

With your long blond hair, I couldn't sleep last night
With your long blond hair.

(Bob Feldman, Jerry Goldstein, Richard Gottehrer)

segunda-feira, dezembro 11, 2006

A mais bela da história.


Segundo a minha opinião, humilde ou não, a mais bela mulher da história do cinema foi Kim Novak. Sobrancelhas e boca, olhar de moça simpática, agradável. Mas uma interessante fragilidade - ora, quem a viu em Um Corpo que Cai, atormentando um frágil ex-detetive, sabe bem do que digo. Quando eu a vi, naquele filme, há tantos e tantos anos atrás, eu me apaixonava e encontrava na tela um perfil de mulher que julgava ser o ideal. Sobretudo porque era leve, como fora Audrey Hepburn; porque era inteligente, como Katherine Hepburn; e porque era sensual, como Marilyn Monroe.

Além do citado filme, de Alfred Hitchcock, outras obras da moça que muito me agradaram: Strangers When We Meet e The Man with the Golden Arm. E há ainda Pic Nic. Abaixo, duas cenas rápidas de Um Corpo que Cai, em que Kim Novak parece mesmo uma entidade onírica, mas assustadoramente humana, sensualmente humana.


O iluminado.


Melhor filme do gênero terror psicótico, O iluminado é do começo ao fim uma verdadeira aula do mestre Kubrick. Abaixo, duas cenas antológicas. Um filme, afinal, pra se ver de madrugada, sem qualquer alma viva por perto. Sem pipoca. Sem pausas e comerciais. E, sobretudo, ó céus, legendado. Aliás, qualquer filme deveria ser visto com legendas. Mas em alguns casos não faz mesmo muita diferença... Alguns filmes não tem lá o que se perder. E concordem comigo: um filme que tem Jack Nicholson não pode ser dublado, nem pelo melhor dos dubladores. Não pode, de jeito algum.


60


Ocupando a 60ª posição entre as 100 canções que mais me comoveram nos últimos trinta anos, Ray Charles e a tijolada em cabeça de bêbado Crying Time, maravilhosa canção de Buck Owens. Música dos diabos. E caso haja algum inocente leitor que não tenha ainda conhecimento da obra de Ray Charles, faça o favor de navegar por tantos clássicos. Incluindo-se os duetos com Fitzgerald e Betty Carter. Talvez convenha começar com o filme, o que não deixa de ser bem interessante. E pelo sítio oficial, aqui.


Crying Time

Oh, it's cryin' time again, you're gonna leave me
I can see that far away look in your eyes
I can tell by the way you hold me darlin' Oooh
That it won't be long before it's cryin' time

Now they say that absence makes the heart grow fonder (fonder)
And that tears are only rain to make love grow
Well my love for you could never grow no stronger (stronger)
If I lived to be a hundred years old

Oh, it's cryin' time again, you're gonna leave me
I can see that far away look in your eyes
I can tell by the way you hold me darlin'. Yeah now
That it won't be long before it's cryin' time

Now you say you've found someone that you love better (better)
That's the way it's happened every time before
And as sure as the sun comes up tomorrow ('morrow)
Cryin' time will start when you walk out the door

Oh, it's cryin' time again, you're gonna leave me
I can see that far away look in your eyes
I can tell by the way you hold me darlin'. Alright now
That it won't be long before it's cryin' time
(That it won't be long before it's cryin' time)

(Buck Owens)

Ctrl+Z.

Um caro amigo e colega de redação deu-me hoje a mais informatizada definição das necessidades humanas: um control+Z seria suficiente para acabar com praticamente todos os nossos problemas. Se bem pensarmos, notaremos que quase toda merda nasce de um gesto ou palavra sem zelo. De um breve instante, a calmaria cede espaço ao caos. Bastaria ao desafortunado, apertar e reapertar o botão que nos faz voltar no tempo. E nada muito complicado. Em alguns casos, uns minutos bastariam.

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Ter um relacionamento é algo bacana. Vez ou outra se quer fugir, mandar às favas e tudo o mais. Mas, em geral, é bacana. Melhor seria se a mulher viesse com um botão de pausa. Quando viesse com aquele punhado de palavras inquisidoras, pausa. Quando viesse com cobranças estapafúrdias e acusações sem o menor sentido, pausa. Quando resolvesse comentar animada as últimas peripécias de algum bebê da família ou aparecesse com elogios aos parentes, pausa. Quando criticasse o nosso silêncio, pausa. Quando gritasse, quando confundisse alho com bugalhos, quando pedisse um novo vestido, pausa. Pausa, pausa, pausa.

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Talvez um botão de volume já me bastasse. Quando a gritaria estérica surgisse, abaixaria o volume. Ao zero. Como seria salutar! Como seria bom se houvesse alguma discussão em pleno e ameno silêncio. Porque nem me incomoda tanto a briga e as atrapalhações - não tenho mais ouvidos para escândalo de gente enganada. E para gritos que se acreditam ofensivos.