sábado, fevereiro 10, 2007

Estranheza e sono.


Vez ou outra nos sentimos cansados. Um cansaço que vai além do natural, além daquele cansaço de quintas-feiras. Seria mesmo um cansaço que é acúmulo de diversos cansaços cotidianos, que começam com o diário e cruel despertador e seguem sistematicamente com um punhado de bobagens que, acumuladas, conseguem nos deixar em frangalhos. Mesmo que durmamos, fumemos de boas ervas, bebamos de nobres vinhos, o tal cansaço não nos deixa. Mesmo que descansemos à sombra de alguma árvore, a sensação de que um saco de cimento nos aperta os ombros continua.

Um amigo me dizia que nestas horas somente há um remédio: um cansaço maior. Seja por um trabalho pesado, seja por duros exercícios. O que se precisa é de um cansaço que suplante o outro, em dor e gravidade. E me aconselhava sempre: "não seja um intelectual pálido e cansado. Corra, sempre que puder, e mantenha-se sempre realmente cansado".

Agora me convenço. Preciso com certa urgência de algum cansaço, de alguma tarefa árdua que me faça depois dormir feito uma pedra. Uma pedra absolutamente quieta, absolutamente alheia a tudo.

Que maravilha...

Encerremos a semana com uma maravilhosa passagem de La Traviata, de nosso amigo Giuseppe Verdi. Em breve, se nenhuma preguiça me tomar, postarei paulatinamente o que seria um curso panorâmico-desencanado de música... Mas não sei ao certo se o farei... Preciso evitar a fadiga e não me meto em nada que me pareça cansativo.

Não sou exatamente um especialista, mas ainda me espanto com a ignorância comum que praticamente todos têm da história da música. Em verdade, me espanto com a ignorância de absolutamente qualquer coisa. Mas uma coisa é ignorar a tabela periódica, outra é ignorar Bach, Verdi ou Villa-Lobos. Não que a vida se torne melhor ou melhor enfrentemos a vida. Apenas nos alimentamos de antídotos, anticorpos e ampliamos em pelo menos mil vezes o gosto que sentimos ao ouvir alguma boa canção.

30

Ouçamos a 30ª canção... Outra aparição da banda inglesa Queen, agora com um de seus clássicos menos badalados - The prophet's song, canção que abre o lado B de A night at the opera, álbum que está entre os mais bem produzidos da história. É uma canção estranha para alguns, um tanto experimental além da conta. Há trinta anos tais experimentos sonoros eram comuns e vistos com bons olhos e ouvidos - até mesmo pela indústria. Lembro-me de tê-la ouvido pela primeira vez em 1986, época em que possuía tão somente 14 anos. Mas não me comovera de imediato. Precisei ouvi-la cerca de trinta vezes para que eu amasse.

Natural que, entre todas, Bohemian Rhapsody tenha logo me enfeitiçado. Tive um verdadeiro surto imagético com tamanha maravilha, música que está além do que é comum - em diversos aspectos. Mas talvez tanta paixão tenha esfriado ao longo destes quase 18 anos, em que justamente aquela que mais me causara estranheza inicial permaneceria como a mais ouvida e admirada. Ao conhecer The prophet's song, lembro-me de me perguntar algo como "onde está a graça desta música?". Sim, onde estaria a graça? Para os meus ouvidos a chave do enigma se encontra aproximadamente aos três minutos da canção. Ouvindo um trecho de tão somente vinte segundos eu percebo a graça de tudo isso. E acho que somente naquele instante, na observação daquele pedaço, eu compreendo o que é aquele disco, o que é aquele tipo de música, o qual misturava sons e silêncio como nenhum outro...

Os demais oito minutos de música me soam somente como masturbação musical - e não creio que haja melhor masturbação já feita na história do rock.



The Prophet's Song

Oh oh people of the earth
Listen to the warning
The Seer he said
Beware the storm that gathers here
Listen to the wise man

I dreamed I saw on a moonlit stair
Spreading his hands on the multitude there
A man who cried for a love gone stale
And ice cold hearts of charity bare
I watched as fear took the old men's gaze
Hopes of the young in troubled graves
I see no day, I heard him say
So grey is the face of every mortal

Oh oh people of the earth
Listen to the warning
The prophet he said
For soon the cold of night will fall
Summoned by your own hand

Oh oh children of the land
Quicken to the new life
Take my hand
Ooh, fly and find the new green bough
Return like the white dove

He told of death as a bone white haze
Taking the lost and the unloved babe
Late too late all the wretches run
These kings of beasts now counting their days
From mother's love is the son estranged
Married his own his precious gain
The earth will shake in two will break
And death all around will be your dow'ry

Oh oh people of the earth
Listen to the warning the seer he said
For those who hear and mark my words
Listen to the good plan

Oh oh oh oh - and two by two my human zoo
They'll be
Running for to come
Running for to come
Out of the rain

Oh, flee for your life
Who heed me not, let all your treasure make you
Oh, fear for your life
Deceive you not the fires of hell will take you
Should death await you

Oh, oh, people can you hear me (oh, oh, people can you hear me)
(Oh, oh, people can you hear me)

Now I know (now I know) (now I know)
Now I know that you can hear me (now I know that you can hear me)
(Now I know that you can hear me)

Now I know (now I know) (now I know)
The Earth will shake in two will break in two will
Shake in two will break in two
(the earth will shake in two will break in two will
shake in two will break in two)
(the earth will shake in two will break in two will
shake in two will break in two)

Doubts all around around around around around around around around
Now I know (now I know) (now I know)
Listen to the wise man (listen to the wise man) (listen to the wise man)

Come here (Come here)
I you come here (I you come here)
I you come here (I you come here)
I you (aah)
Aah (aah)
Ahaa (ahaa)
Aah (aah)
Ahaa (ahaa)

Listen to the mad (Listen to the mad)
Listen to the man (Listen to the man)
Listen to the mad (Listen to the mad)
Listen to the mad man (Listen to the mad man)

God give you the grace to purge this place
And peace all around may be your fortune

Oh oh children of the land
Love is still the answer, take my hand
The vision fades, a voice I hear
"Listen to the madman!"

Ooh, but still I fear and still I dare not
Laugh at the madman

(Brian May)

sexta-feira, fevereiro 09, 2007

A diretoria.


Ridley Scott seguirá presente neste blog por mais algumas semanas. São tantos os filmes e poucos os trailers disponíveis que não me adiantaria desesperar. Vou postando, sem lá muita regularidade, tal qual já faço com a aquela lista das cem canções...

Como não há pressa, posso me encarregar de buscar pôsteres e outras coisas que possam enriquecer a humilde postagem. Como é caso da postagem que tento a todo custo concluir agora. Não há vídeo, trailer ou seja lá o que for deste filme de 1987, Someone watch over me, estrelado por Tom Berenger e Mimi Rogers.


O quinto filme de Ridley Scott, um noir com ritmo muito bom - e todos sabem o quanto o ritmo é importante para um filme de suspenses e romances. Apesar de ser um filme pouco lembrado na filmografia de Ridley Scott, tem qualidades que nos permitiríamos colocá-lo entre os melhores da obra do diretor inglês. É discreto, excessivamente discreto, e talvez por isso tão desprezado por alguns cinéfilos. E é ainda mais discreto se o comparassêmos a Alien, Blade Runner e A Lenda, filmes pavões, cheios de firulas imagéticas, monstros, andróides e duendes. Mais espetaculares e inventivos. E naquela época tais filmes eram realmente inventivos. Hoje tais fórmulas já nos parecem desgastadas, estéticas defasadas e mundos tantas vezes recriados.

Perigo na noite está disponível em DVD. Confira quando puder. É singelo, mas o caso aqui não é de lendas e futuro. É de metalinguagem: um filme feito de referências e seguindo os modelos consagrados pela indústria cinematográfica. Principalmente aquelas formatadas por Alfred Hitchcock.

Um dos culpados?


Dizem as más línguas que a Pop Art trouxe a idéia de que não era necessário "ser artista" para que o sujeito se metesse a pintar quadros e compor músicas. Que qualquer ameba, tendo vontade, poderia se acreditar um novo expoente do show business. Dizem as más línguas que a Pop Art fez bem ao século XX, trouxe-lhe frescor e juventude. E cores, muitas cores. Mas, no entanto, trouxe-lhe também uma desenfreada popularização da arte, decretando de forma estrondosa o fim da arte clássica e alterando completamente a relação entre artista e obra, entre público e crítica, entre ofício e oportunismo.

Não sei ao certo o que penso sobre tão profundo tema. O que sei, e sabemos todos, é que qualquer imbecil hoje escreve um livro. Hoje, qualquer figura desinteressante e sem qualquer talento pode se aventurar, tendo lá alguns trocados para bancar a atividade, a ser estrela, astro da canção, dos rebolados. Se por um lado é uma tragédia que haja tantos atores, músicos, pintores e escritores cheios de empáfia, talento-zero e produção absolutamente descartável, por outro lado, deu-se voz a muita gente antes calada. Ou melhor analisando, surgiram ouvidos dispostos a ouvir seja lá o que for, o que legitima qualquer coisa que se faça neste mundo.

Andy Warhol, dizem as péssimas línguas, seria um dos grandes culpados. Depois dele, houve quem pendurasse um prego na parede, envolvesse com moldura, logo anunciando um "novo conceito estético", uma revolução de significados. O que me incomoda, tão somente, é que qualquer pessoa, sem orientação e amor pela arte, possa ocupar o espaço de outra, preparada, talentosa, cuja relação com a obra é mais visceral e menos fruto de uma carência que bem poderia se resolver de outro modo.


Culpado ou não, Andy Warhol merece sempre uma revisitação. Caso queria uma leve sugestão, comece por aqui ou aqui. Ou aqui.

O mundo magro, o mundo gordo.


Há algum tempo fiz uma postagem em que anunciava um novo regime neste meu corpo. Passaram-se alguns meses e se foram já dez quilos, envolvido eu num doloroso processo de abnegação e tortura. Abandonei os sorvetes e pudins, as paçocas e os tais cereais matinais que sempre devorei pelas madrugadas. Abandonei o prazer que nos escorre pela língua quando devoramos um simples e eficaz bolo de fubá. Estou quase magro agora, faltando-me pouco para chegar ao inicial objetivo.

E nisso tudo, uma rápida observação: há quem diga que sou forte, um abnegado que suporta uma dieta por meses, sem que eu seja abalado por coisa alguma, mesmo o mais delicioso dos merengues humanos. Não. Sou ainda um glutão desesperado por comida. E nada me torna mais feliz que um açucarado sagu, um doce de abóbora, uma geléia de abacaxi no meio do pão francês. Apenas não sei como ainda não enlouqueci... Ou já estaria eu louco a ponto de suportar tanta fome de delícias?

Keira Knightley é uma bela moça. Bem magra e talvez ainda mais magra do que os nossos olhos podem enchergar por fotos e cinema. Ao escolhê-la para a capa desta semana, logo lembrei-me de moças que conseguem morrer (ou adoecer) por culpa de uma tal anorexia. Compreendo que a vaidade (e tão somente a VAIDADE, nada além disso!) possa transtornar um sujeito a ponto de fazê-lo ver o alimento com certo desdém, com certo ódio. Mas como pode uma mulher, sabedora talvez de sua beleza, permitir-se definhar, tão somente por uma...

Ora, como vou saber o que se passa na cabeça de uma mulher? Seja ela saborosa como uma Sohia Loren, seja ela uma destas belas meninas magras. Sei apenas que os homens nada tem com isso. Perguntem a mim o que acho e direi certamente: mulher perfeita não precisa exatamente ser perfeita, uma vez que as imperfeições constroem também o que há de belo na natureza, num quadro, numa sinfonia.

Minuto de subversão.

Resta-me repetir, como forma de me acalmar, o que nos dizia um violento poeta, tão descontente com o desarranjo do mundo que existe em nossa imensa cabeça:

Há doenças piores que as doenças

Há doenças piores que as doenças,
Há dores que não doem, nem na alma
Mas que são dolorosas mais que as outras.
Há angústias sonhadas mais reais
Que as que a vida nos traz, há sensações
Sentidas só com imaginá-las
Que são mais nossas do que a própria vida.
Há tanta cousa que, sem existir,
Existe, existe demoradamente,
E demoradamente é nossa e nós...
Por sobre o verde turvo do amplo rio
Os circunflexos brancos das gaivotas...
Por sobre a alma o adejar inútil
Do que não foi, nem pôde ser, e é tudo.

Dá-me mais vinho, porque a vida é nada.

(Fernando Pessoa)

Confissões de um vagabundo.

Nasci pra ser um boêmio, levando comigo as malemolências de um Vadinho e os versos de canções que são somente ouvidas pela madrugada. Mas me entortei demais na vida, segui caminhos obscuros e acabei me transformando num correto profissional da educação e do funcionalismo publico. Nasci pra viver pela madrugada, tão somente pela madrugada, feito um vampiro de dentes curtos, a repetir diariamente o mesmo mantra sagrado dos boêmios, a beber e a fumar sem parte nenhuma com as complicadas exigências do sistema, alheio, lunático e contente. Nasci pra ser vadio, levando comigo meu violão, observando a alvorada com devoção, dedicado tao somente ao meu endonismo de poeta ( um endonismo que se permite um certo sofrimento provocado e inspirador).

Mas este mundo de tantas lógicas que desconheço me corrompeu. Tornei-me aquele que acorda cedo, sai cambaleando pela rua, sonolento e amassado, carregando certa angústia de quem pouco dorme e detesta um cotidiano de trabalho, trens e impostos. Um preço muito alto para as minhas pessoais regalias e vícios, os quais somente tenho porque o salário me permite. Um salário que é ganho, não obstante os meus queixumes de vagabundo frustrado, com muita facilidade e segurança.

Há exatamente sete dias de minhas férias, encontro-me ensaboado de irritação. Os pés parecem presos a pesadas correntes e as costas - estas costas que ainda me causarão certamente difíceis desgostos - parecem judiadas por um invisível saco de cimento. Eu não me sustento em pé, sem reequilíbrios providenciais - e nada me convence: o que me estraga é a eterna responsabilidade masculina diante de um mundo cada vez mais hostil aos que são como eu, criaturas de preguiça e leveza. Estou a cada dia me estragando mais e em breve a transformação pode enfim chegar ao seu mais alto termo. Serei um apático funcionário do governo, com corcovas e pouco assunto, sem inspiração para a arte, sem dentes e sem a menor vontade de cantar.

Preciso logo de férias, doses de uísque barato, drogas diversas e noites em que a única obrigação é se entreter com perversões e danças desconexas. Preciso logo reencontrar os amigos, vagabundos como eu, pra se falar de bobagens, cobiçar mulheres inexistentes e relembrar que ainda há açúcar envolvendo a merda de vida que levamos. Preciso logo de antídotos que me façam lembrar que eu sou ainda, por baixo de tantos escombros (de altos prédios quiméricos derrubados por uma responsabilidade que não cabe em mim), tão somente um sujeito que respira poesia, música e embriaguez.

Como Peter Pan, tento mesmo evitar a maturidade, mas a minha incompetência não me permite nada além de reclamar - e todos os dias vou para o trabalho, pensando no que seria a minha vida sem ele. Ah! Maldita arapuca capitalista! Ainda me transformarei numa enorme e ridícula barata, tal qual naquela novela de Kafka! Uma barata - aos meus próprios olhos.

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

A Força de Verdi.

Ouçamos agora a overture de A força do destino, de Giuseppe Verdi, em interpretação do maestro James Levine "à la baguette du" Metropolitan Orchestra. Pra se ouvir a qualquer hora do dia, da noite - ou da vida. Realmente muito bom... E nestas horas eu acabo por pensar, de algum modo espantado, que nesta tarde de fevereiro, Verdi, Levine, tanta arte, a rede de computadores, o vídeo, tudo se encontre ao meu alcance, ajudando-me a suportar outra tarde de tédio e cárcere... Não me permitindo cair na tentação de tão somente vegetar, feito uma comprida samambaia, que ao lado de minha mesa nada parece querer ou pensar.

31


Há canções que são regravadas centenas de vezes - sem que haja a menor necessidade. Depois de meia dezena de gravações competentes, resta deixar o que está como está. So in Love, do genial Cole Porter, um dos maiores compositores da história da música, teve inúmeras versões, sem que houvesse qualquer contribuição, nova interpretação ou arranjo diferente. Sei bem que a música é realmente deliciosa de se cantar, mas não merece mais versões sem qualquer personalidade. Aliás, depois que esta lista acabar, em algumas semanas, teremos uma outra, em que sete versões diferentes de uma mesma canção serão apresentadas semanalmente. Mas, creio eu, com versões que contribuem e acrescentam algo. So in love, 31ª colocada entre as cem canções que mais me comoveram nesta vida de chuva e estio, teve já gravações esplendorosas - sobretudo as versões de Julie London (1965) e Frank Sinatra & Keely Smith (1963).

Abaixo, escutemos Caetano Veloso - que costumeiramente arraca leite de pedra, conseguindo bem interpretar canções que são quase medíocres, dando-lhes mesmo alguma beleza - numa versão de So in love que não chega a maravilhar, mas mantém a dignidade que Caetano leva consigo desde o berço. E se a divina providência dos mp3 me ajudar, logo que puder, refaço a postagem, acrescentando a versão de Julie London ou a de Ella Fitzgerald - um tanto mais suaves e tristes para os ouvidos deste devotado fã de Cole Porter.



So In Love

Strange, dear, but true, dear,
When I'm Close to you dear,
The stars fill the sky,
So in love with you am I.

Even Without you
My arms fold about you.
You know, darling, why,
So in love with you am I.

In love with the night mysterious
The night when you first were there
In love with my joy delirious
When I knew that you could care.

So taunt me and hurt me,
Deceive me, desert me,
I'm yours ‘til I die,
So in love,
So in love
So in love with you, my love, am I.

(Cole Porter)

X-rated.


Outra excelente dica do sempre interessante caderno Informática da Folha de São Paulo. Trata-se de mais um sítio cheio de pôsteres - e todos sabem bem o quanto pôsteres são coisas boas de se ver, pois nada deve melhor representar os estilos e manias de cada época, desde que o primeiro dos posteres foi feito. Visite o sítio X-rated Collection e veja algumas dezenas de boas imagens, as quais divulgam filmes pornográficos produzidos entre os anos 60 e 70.

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

A diretoria.

Abaixo, o terceiro e o quarto filme de Ridley Scott. Blade Runner (1982), obra-prima (ou seria apenas um cult movie?) que bem representa aqueles anos 80 - e segunda adaptação literária, agora de Do Androids Dream of Electric Sheep?, novela escrita por Philip K. Dick. E Legend (1985), fantasia razoável que impulsionou a carreira de Tom Cruise, o tal ex-marido de Nicole Kidman. Com ambos os filmes, Scott confirma seu bom início de carreira, voltando novamente a nos apresentar dois novos mundos, cheios de inventividade. Naquela época, lembro-me de me pegar pensando: "o que fará agora este sujeito?", curioso com as possibilidades que o cinema - naquela época um pouco menos rico de efeitos especiais - poderia de repente nos oferecer.


As 24 horas de um dia não bastam para nada.


Alguém mais deseja que o dia durasse ainda mais, além das poucas 24 horas - uma vez que há tantas coisas bacanas que a gente pode fazer? Ou a maioria mesmo prefere desejar que seja mais rápida a vida? O que me parece, afinal, é que os descontentes, entediados e infelizes sempre torcem pela rápida passagem do sol e da lua. Querem mesmo é logo deitar, dormir e sonhar (ou não sonhar). E que os mais bem aventurados e atarefados, como estou eu há algum tempo, sofrem mesmo é com a rapidez de tudo.

Ponho-me a escrever... Logo se passam quatro horas sem que eu tenha conseguido chegar a algum bom lugar. Ponho-me a conhecer sítios e programas (como o excelente OnLineLive, um aparelho de televisão que transmite via rede) e logo a noite acaba sem a menor consideração com este animal racional. Assim, as madrugas logo chegam e eu, ainda acordado, me desespero com o sono que terei na manhã seguinte, quando eu já deveria bem estar acordado e disposto para enfrentar o tédio profissional.

Todos os dias, sono profundo e altas doses de café pela manhã. Mas que posso fazer? Há tanto o que se ler e ouvir, tanto o que se saber, tantas as possibilidades... Como é que posso dormir, afinal? Nada me incomoda mais que o cansaço que a cabeça ganha depois de horas a se exercitar com velharias e novidades.

Neste exato momento estou a ponderar sobre aproximadamente umas dez possibilidades de tarefas, todas devidamente interessantes e levemente úteis. Mas sei que o restante de noite que tenho não me permitirá muito. Entre as tarefas possíveis está uma postagem na qual deveria ponderar sobre Keira Knightl e a magreza que persegue tantas moças deste mundo. Talvez amanhã me sobre tempo para, enfim, terminar tal texto... por hora tenho mesmo que pensar em como aproveitar melhor os meus tão velozes minutos.

E é bem certo que não dormirei antes das 3h. Cada vez mais o tempo me escorre...

Escolhas minhas.

Nesta semana não há "escolhas alheias". Ouviremos então um pouco de música elevada. Apenas o gênio italiano de Giuseppe Verdi. Pra começar, uma espetacular animação francesa, com trecho de La Traviata. Vale inclusive mostrar para os sobrinhos e para os amigos que jamais ouviram ópera por esta vida. O que me parace um absurdo, uma negação de prazeres aos ouvidos - como não gostar de um gênero tão esfuziante?

Um poeta que me compreende.

Ricardo Reis sempre me diz exatamente o que preciso. Sua obra é o meu "minuto de sabedoria". Justamente porque sua sabedoria não se mostra sábia ou educativa. Mas vem desconstruir a solidez de tudo o que há, muda o eixo do contentamento. Nos mostra o que há de mais adorável na vida: a consciência de que a materia, o prazer e a tranqüilidade devem ser cultivados feito flores, com algum adubo e alguma paciência. Hoje, atento ao atropelo que mesmo produzo nas congestionadas ruas de minha cabeça, o poema abaixo me disse bem, com toda a capacidade que o poeta tem de ludibriar os olhos alheios.

Não quero

Não quero recordar nem conhecer-me.
Somos demais se olhamos em quem somos.
Ignorar que vivemos
Cumpre bastante a vida.

Tanto quanto vivemos, vive a hora
Em que vivemos, igualmente morta
Quando passa conosco,
Que passamos com ela.

Se sabê-lo não serve de sabê-lo
(Pois sem poder que vale conhecermos?)
Melhor vida é a vida
Que dura sem medir-se.

(Ricardo Reis)

terça-feira, fevereiro 06, 2007

A diretoria.


A preguiça me toma completamente. Completamente, digo eu. O calor deste verão maltrata-me a cabeça já naturalmente lerda. E como conseqüência desta leve tortura, acabo incapaz de escrever seja lá o que for. Vivesse eu na Islândia, escreveria um Anna Karenina por mês. Mas a semana deste blog precisa enfim começar. E comecemos, portanto, com um novo tema para as postagens. Trata-se de "A diretoria". Semanalmente, todos os trailers possíveis de um único e importante diretor de cinema.

Pois é. Há gente que vê cinema com alguma devoção, sabe o nome de atores e atrizes dos mais diversos tamanhos, mas é incapaz de relatar a obra de algum diretor. Não obstante a importância de roteiristas e editores, o diretor é mesmo quem dá o pulsar e o rosto de uma obra. Comecemos com o reconhecimento de grande parte da obra de um cineasta irregular, mas certamente responsável por ao menos dois maravilhosos filmes, Alien e Blade Runner, referência básica para quase tudo o que é feito ainda hoje. Ridley Scott fez certamente algumas bobagens, mas ainda merece - até que por fim nos confirme o contrário - a alcunha de "grande diretor".

Mas sigamos desde o início de sua filmografia. Seu primeiro filme, Boy and Bycicle, de 1965, não possui trailer em nenhum canto. (Quem o encontrar que me indique, por favor). Após oito anos trabalhando para televisão, fez em 1977 seu segundo filme, Os duelistas. Uma boa adaptação de romance de Joseph Conrad, com ótimo elenco. E dois anos mais tarde, seu primeiro clássico, Alien. Um filme que transita entre gêneros diversos, de ritmo magistral.

Ambos os filmes, sem que eu faça análises desnecessárias (para um verão que me torra o cerebelo), são cheios de personalidade e belos . Uma beleza que não está na cara do alienígena babento, nas guerras napoleônicas ou no corpo claro de Sigourney Weaver - porém está no movimento suave da câmera, nos sons e imagens que compõem dois mundo tão diferentes. E a diferença de mundos é um aspecto fundamental para a obra de Ridley Scott.


domingo, fevereiro 04, 2007

Crônica Dominical

O humanidade em breve terá o seu devido (e merecido) fim? Segundo o mais recente relatório do IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change), órgão criado pela ONU, integrado por centenas de especialistas ambientais de toda a esfera, cujo fim é nos alertar para a decadência irreversível deste planeta, o fim já começou. Mas a verdade é que o ser humano é uma praga e conseguirá sobreviver a todo custo - a população provavelmente diminuirá abruptamente e permanecerá ainda por milhares de anos a contribuir com a destruição de todas as coisas, até que nos restem somente as pedras.

Será complicado viver num planeta-sauna, sem água e desviando a todo instante de terremotos e tempestades. E será um verdadeiro campeonato brutal por um copo de água. Cerveja e vinho, então, somente para quem possuir grana em demasia. Muito daquilo que hoje desfrutamos já com certa regalia, nos custando alguns trocados, será ainda mais caro e raro, pra se ter apenas umas poucas veses pela vida, tal qual um simples gole de café ou um cacho de uvas.

A vida será mesmo bem desagradável, sobretudo para os velhos lascados - o que bem provavelmente será o meu caso. Se hoje, qualquer 25 graus já me escalpelam, aos sessenta anos eu serei literalmente cozido pelo calor que há de se expandir por meses e meses, em estiagens intermináveis. Haverá um dia em que Vidas Secas e Morte e Vida Severina serão considerados guias de sobrevivência.

Pobre de quem for pobre. E pobre de quem acreditar que todas estas recomendações são alarmismos de gente ociosa. Somente acho que jamais podemos subestimar a capacidade do ser humano de foder ainda mais com as coisas e continuar existindo, feito baratas sobreviventes ao holocausto. Se há alguém otimista com o futuro, o é por não ter ainda olhado com atenção para o que Homem tem feito desde o princípio de sua existência. O cenário é mesmo desolador.

Mas o que me preocupa agora são as minhas férias em março. Logo o planeta começará a degringolar de raiva e será bom eu já ter conhecido Buenos Aires ou, ao menos, as cataratas do velho Iguaçu. E já que o mundo vai mesmo acabar - e com ele as lembranças de toda a presente civilização, melhor aproveitar, experimentando toda sorte de prazeres. Se livros e esculturas permanecerão, os nossos pecados serão rapidamente apagados da memória deste mundo. Antes que cheguemos a uma nova era medieval, de reconstrução e paciência, vivamos, aproveitando o que nos resta de uma bonança que em breve restará apenas nos livros de história.