sábado, março 17, 2007

Terça, sábado.


Hoje é terça. Mas será sábado para o arquivo eterno deste blog. Mas é terça - e tão somente agora me peguei tendo vontade de publicar alguma coisa. E vai retroativamente. Até que tudo esteja certo na cronologia das coisas.

A filha.


Charlotte Gainsbourg canta The Songs That We Sing. E assim a semana até acaba com certa graça.


As várias faces de um grande personagem.


Estava eu a escrever sobre Frank Miller, mas a página Many Faces of Batman realmente me encantou. São diversas interpretações, de Bob Kane a Alex Ross. São muitas as formas que o personagem adquire, a cada mão, a cada época. Aliás, vale dizer que o personagem, encantador, cada vez mais carrega uma certa ambigüidade que poucos outros super-heróis suportam. Batman foi criado há mais de setenta anos e ainda permanece como uma fascinante representação das neuroses que as madrugadas e as cidades sempre transpiram.

Uns versos suaves.



Uma carniça
Tradução de Ivan Junqueira.

Lembra-te, meu amor, do objeto que encontramos
Numa bela manhã radiante:
Na curva de um atalho, entre calhaus e ramos,
Uma carniça repugnante.

As pernas para cima, qual mulher lasciva,
A transpirar miasmas e humores,
Eis que as abria desleixada e repulsiva,
O ventre prenhe de livores.

Ardia o sol naquela pútrida torpeza,
Como a cozê-la em rubra pira
E para ao cêntuplo volver à Natureza
Tudo o que ali ela reunira.

E o céu olhava do alto a esplêndida carcaça
Como uma flor a se entreabrir.
O fedor era tal que sobre a relva escassa
Chegaste quase a sucumbir.

Zumbiam moscas sobre o ventre e, em alvoroço,
Dali saíam negros bandos
De larvas, a escorrer como um líquido grosso
Por entre esses trapos nefandos.

E tudo isso ia e vinha, ao modo de uma vaga,
Ou esguichava a borbulhar,
Como se o corpo, a estremecer de forma vaga,
Vivesse a se multiplicar.

E esse mundo emitia uma bulha esquisita,
Como vento ou água corrente,
Ou grãos que em rítmica cadência alguém agita
E à joeira deita novamente.

As formas fluíam como um sonho além da vista,
Um frouxo esboço em agonia,
Sobre a tela esquecida, e que conclui o artista
Apenas de memória um dia.

Por trás das rochas irrequieta, uma cadela
Em nós fixava o olho zangado,
Aguardando o momento de reaver àquela
Náusea carniça o seu bocado.

- Pois hás de ser como essa infâmia apodrecida,
Essa medonha corrupção,
Estrela de meus olhos, sol de minha vida,
Tu, meu anjo e minha paixão!

Sim! tal serás um dia, ó deusa da beleza,
Após a benção derradeira,
Quando, sob a erva e as florações da natureza,
Tornares afinal à poeira.

Então, querida, dize à carne que se arruína,
Ao verme que te beija o rosto,
Que eu preservei a forma e a substância divina
De meu amor já decomposto!

(Charles Baudelaire)

sexta-feira, março 16, 2007

Outra postagem, apenas.

Ok. Havia dito que seria apenas uma postagem. Mas não será a minha primeira contradição. Para que a semana deste blog receba alguma dignidade, três vídeos de três nomes que particularmente adoro. Pra começar, Creedence Clearwater Revival e o clássico Proud Mary.


Peter Gabriel e a animada Sledgehammer.


E a espetacular No surprise - obra de arte dos ingleses do Radiohead.

Semana de uma postagem só.



É cedo. Bem cedo. Acabo de rever Ieri, Oggi e Domani - clássico italiano com a bela e sempre competente Sophia Loren e com aquele que é o meu ator preferido, Marcelo Mastroianni. É cedo agora. Nem é nove horas e o sol está a brilhar entre nuvens um tanto acizentadas. Estou acordado ainda. E nem me vem à cabeça dormir... até que eu esteja completamente tomado pelo sono. Talvez ao meio-dia. Talvez eu só me deite quando novamente anoitecer.

A semana toda me mantive afastado deste blog. E nem sei ao certo o porquê. Talvez porque eu me sinta mesmo em férias, a largar a cabeça a todos os ostracismos. Em verdade, amigos que há tempos eu não vejo, larguei-me do mundo por algum tempo - pouco me importando os jornais, os últimos lançamentos do mundo da arte, as novas tendências para seja lá o que for. Nada seo do que ocorre neste mundo. Soube muito por cima que um tal presidente do mundo aparentemente civilizado esteve por aqui... Ora, que me importará agora saber de alguma coisa?

Tenho trocado a noite pelo dia. Tenho acordado logo quando o sol desaparece, feito um Drácula sem qualquer imortalidade. Mas diferentemente de um vampiro, não me escondo numa tumba logo que o sol surge. Eu o vejo nascer pela janela de meu apartamento e sempre me sinto tomado por um certo contentamento. E talvez seja este, afinal, o segredo de certo descontentamento que sempre carrego comigo, diariamente. Sou uma espécie de criatura noturna, sem qualquer apreço pelas tardes - todas geralmente vazias. Gosto é da madrugada e das manhãs... porque nelas eu me encontro e penso um pensamento melhor - como se estivesse sempre envolto da mais terna tranqüilidade.


É cedo. E nesta semana não me contive. Larguei-me. Não é a primeira vez que faço isso, nem será a última. Uma clausura pessoal. Em trinta dias, umas quatro vezes tão somente me vi fora de casa, a caminhar pelas ruas. Em tantos dias, distante, sinto-me regenerar. Qualquer um, mesmo o mais tolo dos homens, sabe que é preciso regenerar. E cada um sabe bem o que precisa fazer, para largar os velhos ranços...


Sophia Loren nada tem com o isolamento em que me meti. Ela será a bela da capa que postarei neste sábado próximo. Talvez eu realmente me isole e sinta que nada tenho de útil para dizer - se é que já tive utilidade no verbo alguma vez. Mas jamais deixaria de postar uma capa que tivesse Sophia Loren - porque a regeneração, amigos distantes, jamais chega a certas regiões da cabeça atrapalhada.