sábado, setembro 16, 2006

Vá ao teatro.

Hoje faça algo bacana. Vá ao teatro. Mas nada daquelas peças caras, em teatros enormes e bem ajustados. Escolha algo menos visto. Há muito talento por aí. Mas há também alguma chance de ver algo um tanto ruim. Sempre há aqueles que não têm o menor respeito pelo povo que sai de casa, atravessa a cidade e se move para ver um espetáculo. Há três profissões que não permitiriam desleixo: dentista, padeiro e ator. O que infelizmente a gente encontra... E notem que nem digo de talento. Digo tão somente de respeito.

Como destaque desta semana, a publicação do texto Nada a Fazer Depois de um Bom Jantar. Drama urbano sobre a banalidade e a proliferação da violência miserável de São Paulo. A leitora amiga e o leitor marido deveriam ler o texto, brincando de atriz e ator, pensando, às vezes, como é mesmo desagradável viver com certo medo de andar pela madrugada, em busca daquela última dose...

E fim de papo.


Acaba a semana. Hoje o calor é dos mais estranho. Pois chove uma água gelada e o vento nos dá certos calafrios. Mas é calor. E o dia é realmente bom. Para fechar a semana, em que fiz elogios às curvas de Sophia Loren, apresento-lhes Debra Paget, atriz daqueles tempos de Elvis, tendo participado inclusive de Love me Tender. Diz a lenda que até deitou-se com Elvis. E certamente fez todas aquelas coisas com Elvis... Hum. Conheça a honrada moça num sítio com centenas de fotos em que o bom leitor e a elevada leitora podem obervar as curvas de uma moça que bem deve ter seduzido também alguns daqueles nossos velhos tios, que nos anos 50 se divertiam em sessões de cinema. Um tempo bom que não volta nunca mais.

sexta-feira, setembro 15, 2006

Tempo de vestir vermelho.

Houve um tempo em que mesmo os sujeitos mais machões, aqueles duros de engolir, bravos toscos e amantes de violência e luta entre homens, como o judô, que nada mais é que... Bem, naqueles tempos havia The Smiths. O povo dançava rebolando feito fresco. Todos. Até os caras que jogavam de zagueiros lá nos times em que eu demonstrava toda a minha(in)habilidade para o desporto. Não eram fáceis aqueles tempos, sobretudo para um intelectual mirim e cabeçudo. A canção é o poema oitentista Heaven Knows I'm a Miserable Now. Aliás, apenas um pensamento de agora: The Smiths foram somente possíveis na Inglaterra. Um tipo de música impossível de ser desassociada daquele povo. Justo que eu considere que os Smiths sejam música regional. Tão identificada à sua gente está. Meio como Luiz Gonzaga e Adoniram Barbosa.

Loucura é alimento?

Há coisas que eu nunca entendo. Tanta coisa. Demais até para o meu tamanho. Creio que todos os dias, antes mesmo de escovar os dentes, pela manhã, alguma dúvida me toma. É todo um mundo de questões que nunca me levam a qualquer resposta. Por que não ouvimos Cyro Monteiro nas rádios? Por que não confiamos em ninguém? Por que não comemos mais frutas? Por que há tanto medo de tudo, de tristeza, se suportaremos tudo com a mesma dignidade de anteriores tristezas? Por que escrever num blog todas as dúvidas que me perpassam a mente, se eu poderia mesmo dizer que sou daquelas figuras que descobriram alguma fórmula para a plena realização, ganhando com isso inclusive a admiração de todos? De onde vem tanto desencontro? Todo mundo é assim? O fórceps que me trouxe ao mundo me lascou a cabeça? Todo mundo também não sabe um jeito de acalmar o pânico? Alguém poderia me responder?

Nunca conheci quem levasse porrada... disse-me, quase em confissão, aquele amigo poeta lisboeta. Andei levando porrada, tropeçando nos tapetes, nos termos e nas idéias. Hoje mesmo acordei pensando demais, numa velocidade incomum em dia de tanto Sol, que deveria mesmo ser de contemplação. Mas a cabeça parece uma caixa de Pandora toda bagunçada. E os demais? Somente, hoje, alguém poderia me responder? Sou o único a ter pensamentos confusos, que me derrubam a vontade de sorrir? É normal ter a vida torta e ainda mais torta dentro da cabeça cheia de imaginação nem sempre agradável? O que se passa na cabeça alheia é mistério demais.

Uma vez, há tantos anos, um sujeito de olhos amarelos, disse-me que eu era assim, um poço de questões inúteis, por não ter a companhia de um deus. Ora! Que forte ilusão é essa que consegue eliminar da mente os mistérios e os temores? Que vida é essa? Como ficaria? Desde que eu me conheço por gente, sem nunca ter tido um minuto de anulação, dúvidas me movem. Meu combustível. Pra escrever. Pra me embriagar. Para seduzir os amores que me seduzem. Que vida então seria se os parafusos todos arrumassem a engrenagem?

Nem mesmo sei se é loucura, inteligência ou frescura. Se é comum, se é coisa de quem escreve ou se é simplesmente uma mania boba, um vício que pensei ser bom. Nada sei. Nem mesmo sei quando é nobre confessar o que todo mundo sente, mas que fica lá, sobre as aparências do eqüilíbrio.

quinta-feira, setembro 14, 2006

Antes dos quinze anos.

Outro clássico daquele meio dos anos 80. Que afinal de contas, até foi uma década bem divertida. Em verdade, acho isso uma bobagem. Todas as décadas são bacanas. Sempre há muito o que se ver, sempre há uma porção de lixo para se jogar fora. Mas pensar que já faz vinte longos anos que ouvi esta canção pela primeira vez... Não deixa de ser assustador. Muita gente que hoje vive ao meu lado nem havia nascido. Ah! Como dizia o poeta: carpe diem et noctem! Ouçamos os noruegueses A-ha e a realmente bela There's never a forever thing.

Falando de opulência.

Mulher é bom demais. Às vezes, convenhamos, é bom até demais. Vira a cabeça da gente de um jeito meio desumano. Ah! E se mulher é bom, seja de que jeito for, algumas são ainda melhores. Aquelas cujas curvas sejam como aquelas que tinha Sophia Loren. Aquelas cujos lábios sejam como aqueles que estavam na boca de Sophia Loren. Bem, a atriz italiana está bem viva, mas hoje o tempo fez o desagradável serviço de misturar a beleza ao tempo – e a forma acaba sendo mesmo outra. Nada mais natural nesta vida que só sabe mesmo renovar as coisas todas.

Conheça o sítio oficial desta bela e essencial atriz, que esteve em grandes obras do cinema, tais como Duas Mulheres, Girassóis da Rússia e Ontem, Hoje e Amanhã, só para citar o óbvio.

O maior invenção dos homens.

Querido e inexistente leitor, pense rápido: qual a grande invenção da história? A roda, o clipe de papel ou o chuveiro elétrico? Nada disso. A grande invenção foi o walk-man, hoje chamado de mp3 player, mas que será ainda, em sua essência, sempre um walk-man. Trazer a música para a cabeça, tão discreta e pessoalmente, para o cotidiano, para os caminhos... nada me parece tão bom. Caminhar, seguir com o corpo nos vagões de trem, nas calçadas, escadas, em todos os lugares, enquanto só pra você, apenas, a canção soa, feito um segredo.

Por estes dias comprei um desses tocadores de mp3 e o enchi com canções das mais diversas. A mesma travessia que fazia agora tem novos moldes, novo gosto. A avenida que percorro, que antes era uma balbúrdia de som ruim, de carros e vozes e alto-falantes de lojas a anunciar qualquer porcaria, agora tem George Harrison a cantar My Sweet Lord. O vagão de trem que antes era tão somente animado por aqueles ceguinhos cantores a bradar "abençoai as famílias, amém", agora tem Noite Ilustrada e Isaura Garcia.

É ter a vida com trilha sonora, feito um filme. Mesmo o trajeto mais desprovido de graça ganha lirísmo. Nos tornamos personagens e as idéias parecem melhor motivadas. Tantas e tantas idéias me surgem. Aliás, ouvindo uma obra-prima de Mozart (K 516), em meu hoje aposentado walk-man de rádio e K7, tive toda a concepção do texto "Índice Koechel", drama que logo publicarei por aqui.

O Governo, fosse mais esperto, deveria criar incentivos fiscais para que todos pudessem ter o seu Ipod ou genérico. Seria menos falação e mais lirísmo por todos os cantos. Poder andar enquanto há Mozart nos faz o caminho melhor, assustadoramente melhor. Os transeuntes ficam até mais belos. Não há tanto caos. Nem tanta sujeira. A hipnose que esta coisa estranha e fascinante que é a música nos traz. transforma e alivia toda e qualquer caminhada estúpida. Meio como a vida mesmo. Sem música, a vida é ainda mais bastarda.

E silêncio só é bom mesmo quando precisamos ter saudade.

PS.: ouvi ontem, nos caminhos, o disco solo de Thom Yorke. Bom disco. O problema, caro leitor nem sempre inexistente, é que o ouvi depois de ter ouvido uma coletãnea de Cyro Monteiro e antes de outra, de Wilson Simonal. Assim, nem tem jeito, pura covardia. O disco de Thom Yorke me pareceu tão desnutrido quanto uma dessas modelos de hoje em dia, pernas longas, rostinho simpático, quando comparada a uma Sophia Loren, a uma Anita Ekberg, a uma Vera Fischer...

quarta-feira, setembro 13, 2006

Quem inventou o ciúmes?

Não é possível para um abobado escorpiano como eu viver sem o ciúmes, essa porcaria de tontura que nos acomete nas horas mais silenciosas. Alguns leoninos são por demais seguros. Alguns geminianos, por demais aéreos. Mas, nós, raça dos diabos, sofremos dessa coisa que não tem a menor graça. E curioso é que o ciúmes vem de repente, entre os goles de café, entre um bocejo e outro, entre um piscar de olhos que bem notavam outras idéias. É como se fosse mesmo um resfriado, nada a fazer. É esperar e esperar. E nem sei mesmo o que é mais difícil: talvez seja manter a calma, como se nada realmente acontecesse dentro da cabeça frágil. É contar os minutos, um após outro, é tentar lembrar daquilo que traz certa tranqüilidade... É pensar que o ciúmes é um efeito químico, feito a depressão.

Certa vez um maldoso libriano (coisa comum, aliás) disse-me algo que não se deve dizer a um escorpiano perturbado (coisa comum, aliás): "se o pensamento sente, há". Eu me divirto com essa gente que gosta de animar a nossa vida, de maneira tão peculiar... Mas que nada. Sabemos, nós, criaturas de água esquentada, que este é o preço que a gente paga por sermos assim, tão apaixonantes. Hum... depois dessa minhocada astrológica, uma canção esfuziante para abrilhantar a semana de canções "antes dos 15" e para devolver a sanidade a quem precisa. O virginiano Freddy Mercury em outra de suas iluminadas interpretações. Ouçamos Queen e Don't Stop me Now.

Melhor mesmo nem pensar em parar. Que esta canção é pra ser ouvida umas doze vezes.

Violência e banalidade.

Está neste blog, pra quem quiser ler, Nada a Fazer Depois de um Bom Jantar, drama em ato único, escrito na época em que residia na encantadora Rua Nestor Pestana. Trata-se de um texto levemente diferente dos demais que escrevi até agora - mas estão lá, entre tantas coisas, as discussões que tanto me interessam. A idéia deste texto surgiu, se bem me lembro, em 2002, durante um jantar, mas foi somente quando vivi no centro desta complexa cidade, infectada pela sujeira e por milhares e milhares de pessoas a viver nas ruas, sobrevivendo a todo custo, em 2005, que senti mesmo a necessidade de colocar no papel tanta perplexidade. Qualquer ida à padaria já nos era uma certa aventura - a todo instante éramos interpelados por pedintes dos mais variados tipos. Marginais outros nos observavam, seguiam até. Existe nisso tudo algo profundamente estranho: a violência indireta, quase psicológica, renitente, que vai nos tirando o prazer de caminhar contra o vento, sem qualquer obrigação. E, no entanto, a vida deve continuar. Se na frente do prédio havia, vez ou outra, algum sujeito de olhos esbugalhados e raivosos, havia também uma resignação que não nos permitia outra coisa, a não ser continuar com a vida, com o que ela tem de bom.

À parte a banalidade com a qual a violência é tratada pelos personagens do texto, numa mistura complexa entre o íntimo e social, existe em Nada a Fazer Depois de um Bom Jantar uma discussão rasteira, que trata da compreensão que a sociedade acaba por fazer da lealdade e da coexistência das diferenças. Bom divertimento, amável leitor, e, havendo alguma indignação, me escreva.

terça-feira, setembro 12, 2006

Uma nota rápida.

Bem aventurado aquele que tem o Canal Brasil na sua televisão. E pode ver e rever algumas das grandes maravilhas do cinema nacional. Tais como Um Trem para as Estrelas, Besame Mucho, Assalto ao Trem Pagador e Edu, Coração de Ouro. E pensar que agora muitos sofrem com a programação da nossa precária televisão aberta. Ao menos aqueles que nada têm de melhor pra fazer nesta terça-feira. Como eu, aqui, quieto, dividindo os olhos entre as duas telas iluminadas, o televisor e o monitor do computador. Sem pensar no mundo que há lá fora.

A ocasião faz o monge.

A ocasião faz o monge, o ladrão. Faz de qualquer sujeito, mesmo o santo, um demônio quando o mundo - que é grande feito tudo - bem deseja. Meio fantoches somos todos. Se o prato de comida acaba, temos fome. Se nos oferecem pão com patê gostoso, comemos. Nem pensamos em mais nada. Comemos. Mais e mais vezes queremos. Nos tiram o pão, ou o pão acaba, ou o pão mofa. Ou sei lá que desgraça acontece com o pão, sempre. A ocasião faz o comedor de pão. Até porque há pães demais no mundo.

Quando de minha adolescência, eu já me confundia todo com as idéias, a canção abaixo me fazia bem. Dava-me certa traqüilidade. Nem gosto muito. Mas não neguemos jamais o efeito letárgico da banda de Robert Smith, The Cure. Sobretudo com esta bela Close to me.

Como nos pregava aquele nobre cavaleiro. "caluda! caluda! Guardai vossas espadas para as bestas-feras! Guardai vossos encantos para as donzelas!". Sei lá, imaginário leitor. Há chão pra toda abóbada. E metáforas que explicam tudo, mesmo que jamais nos ajudem.

Feliz Aniversário, moço.

Se estivesse vivo, Álvares de Azevedo completaria hoje 175 anos. Bastante tempo para a história jogar poeira em sua obra. Como bem há poeira em toda a poesia romântica, que deverá novamente ter seu sentido revolucionário valorizado daqui a algumas décadas. Talvez nem mais esteja sendo lido por ninguém, mas não deixo de lhe prestar as devidas homenagens. Não há sujeito cuja poesia seja, apesar de certa inocência, tão intensa e erótica. Eu, que tenho quadratura de Lua e Netuno, o venero. E o invejo.

EU

Cavaleiro das armas escuras,
Onde vais pelas trevas impuras
Com a espada sanguenta na mão?
Porque brilham teus olhos ardentes
E gemidos nos lábios frementes
Vertem fogo do teu coração?

Cavaleiro, quem és? o remorso?
Do corcel te debruças no dorso....
E galopas do vale através...
Oh! da estrada acordando as poeiras
Não escutas gritar as caveiras
E morder-te o fantasma nos pés?

Onde vais pelas trevas impuras,
Cavaleiro das armas escuras,
Macilento qual morto na tumba?...
Tu escutas.... Na longa montanha
Um tropel teu galope acompanha?
E um clamor de vingança retumba?

Cavaleiro, quem és? — que mistério,
Quem te força da morte no império
Pela noite assombrada a vagar?
(Álvares de Azevedo)

Clique, clique.


Conheça a obra sutil de John White Alexander, pintor americano daquele fundamental século XIX, clicando aqui ou por meio de seu buscador preferido. Ando com certa preguiça - justificável, aliás - e nem ando colocando todos os links que conheço. Creio até que o imaginário leitor nem clica mesmo em lugar nenhum. Deveria, certamente. Nem digo clicar para ler as peças deste inotório sujeito. Mas para conhecer a obra de gente grande, seria bom clicar, sem resistência. Quanto mais conhecemos, mais vemos do mundo a melhor parte.

Carne Trêmula.

Calor. Calor que antagoniza com o frio setentrional da última semana. Ninguém deve estar tranqüilo, sabendo que há praias e piscinas espalhadas pelo país. Que há inúmeras moças de biquini e infinitas barracas onde encontraríamos desde a refrescante raspadinha às mais gélidas caipirinhas. Não há como não vislumbrar os lugares onde há tanta água fresca, ondas, areia a nos queimar os pés. E aqui, nós todos, a envelhecer dentro de quatro paredes. Ganhando nossos trocados para, eventualmente, nos oferecermos, quando possível, alguma visita aos melhores cantos. Sim, caro leitor, nada seria tão agradável agora quanto aquela sandália, a deixar os pés levemente descobertos. Hum... era correr daqui, mandar o computador à merda e... Mas de que nos adianta desejar pela longínqüa Passargada se o dever nos diz que é hora de trabalhar? Neste exato momento, tento manter a lucidez, compreender as limitações espaço-temporais e financeiras. Resignar e não ter o humor transformado... Ora, é a tal luta contra a insatisfação...

Não obstante a polêmica causada, na última semana, por minha indignação quanto aos muitos e muitos casos de infidelidade, que apenas me espantam pela banalidade - e não há argumento que me convença que a banalidade, em qualquer aspecto, mereça crédito, volto ao tema, com outro viés. A insatisfação é paradoxalmente aquilo que nos faz andar, percorrer melhores caminhos, nos faz inventar, encontrar novas formas para as coisas; ao mesmo tempo é aquilo que não nos deixa ver que muito do que a gente tem é realmente bom, que merece ser preservado e respeitado. Como nos disse uma vez Chico Buarque, "Nem toda loucura é genial, nem toda lucidez é velha". Ou, traduzindo conforme a necessidade deste texto, nem toda revolução é inteligente. Nem tudo o que é reacionário deve ser desprezado. Seja no amor, seja no trabalho, seja na porra dos desejos que a gente tem, vale encontrar a balança que defina com inteligência o que é insatisfação e o que é tão somente desordem.

Andamos por vezes a reclamar de tudo e todos, criticar com neurose e pânico. Nada nos basta. São os alucinógenso fracos demais, são as canções fracas demais, são os amores fracos, são os alimentos por demais fracos. É como se o mundo não nos acolhesse bem, não nos desse os mimos mais bacanas. Nada nos basta. E isso chega a ser excelente. Quem se acostuma à vida, como tem, acaba virando uma imagem apenas, estática. No entanto, chega um momento de pensar que nem todo o dinamismo é necessário, oras, que permanecer também é bom. Que aceitar uma ou outra impureza na brancura é parte daquela tal lucidez. E que mesmo tais impurezas tornam a beleza particular, especial.

Resignar, quando é hora; enlouquecer, quando é tempo. Sem manual algum vamos levando essa desgraça e delícia de vida, aceitando e desaceitando, buscando pelo termo que nos conforte. A praia está longe, muito longe. Muito longe a raspadinha de groselha, as moças de biquini, as porções de camarão. Melhor mesmo é levantar e beber um gole de café; pensar em como é bom ainda ter das nossas utopias, bem domesticadas - ou logo a cabeça enlouquece, meu irmão leitor. Pensar, enlouquece.

segunda-feira, setembro 11, 2006

For a thousand years.

Naqueles tempos de meninice eu odiava esta canção. Nem sei ao certo o porquê. E como deu-me vontade ouvi-la, creio haver, mesmo contra a proposta inicial, um tema para a semana. Canções que ouvia (ou não) antes dos 15 anos. Esta por exemplo me faz lembrar uma daquelas paixões sem pé nem cabeça que tive antes mesmo do primeiro beijo. A menina, tão inacreditavelmente bela, era meio um personagem dos filmes de Murnau. Mas tão somente aqui dentro da cabeça deste xarope apaixonado. Lá fora, no mundo real, era tão somente uma adolescente deslumbrada com a própria graça. Jamais cheguei a beijá-la. E nem me lembro de ter pedido um beijo. Paixão platônica era um vício que só fui largar depois dos vinte anos. INXS e a arrebatadora Never Tear Us Apart.

Os outros.

O Sol sempre brilha mais depois dos feriados. Sempre há uma certa renovação de força e aparência das coisas que a gente vê. Chegamos quase a um certo otimismo que bem vai se esvaindo pelos dias seguintes. O contato com a monotonia e a sujeira, o excesso de gente e sons, os desencontros quase cotidianos e, sobretudo, os embates de idéias e vontades que promovemos, nesta quimérica batalha de ideologismos, contra tudo e todos, são demais para os nossos fracos juízos. Ou como diria, em sua simplicidade desconcertante, minha companheira, atualizando Sartre sem mesmo conhecê-lo, "as pessoas todas nos querem puxar para baixo". É o poço dantesco das relações sociais: ninguém vai perder tempo elogiando, incentivando, colocando-nos em melhor estampa, aumentando-nos a estima, Nada disso. A gente sempre acaba envolvido pelo abrupto desconhecido - e somos logo tragados, lentamente, por toda sorte de pavores. É o "isso não vai dar certo", "veja como foi ridículo", "você não conseguirá". É um sucessivo universo de críticas e desdém pra tudo o que é lado.

Talvez por um traço cultural. Talvez pela realidade nada agradável deste país. Estamos sempre sendo julgados, sabendo já dos mais corriqueiro dos veredictos. Muitos acreditam mesmo ter uma solida visão do mundo, séria, sábia e justa. Sentem-se juízes, com um código penal pessoal, e saem a condenar a tudo e a todos, sem a menor coerência. Eu mesmo, mea culpa, julguei tantas e tantas vezes e sai escrevendo sentenças de tudo o que é tipo. Afinal, rasgo-as todas e mando às favas as condenações de todo tipo. Hum... O que não rasgo, mesmo, é aquela aversão aos pessimistas profissionais, que saem a profetizar o pior dos resultados, pra tudo aquilo que a gente faz.

É a tal síndrome de V***, que faz um jeito, depois de nos ouvir uma tosse sem escopo, declarar que se trata de tuberculose. Ou, depois de nos ver discutir com a mulher por qualquer bobagem, sair dizendo que se trata de efetiva separação. Ou aquele que diz, ao saber de nosso novo desafio vestibular, que as provas são impossíveis e que não teremos as notas necessárias. A tal síndorme faz o sujeito crer que seus olhos enxergam o mundo com franca realidade. E que somente os outros vivem afogados em ilusão.

Creio eu que a melhor coisa para se seguir com o Sol que brilha, é ignorar, efetivamente ignorar, tudo o que nos é dito assim, com jeito de querer reprimir. Já nos basta o nosso próprio pessimismo, dizendo a todo instante que os outros é que estão certos. Que não chegaremos a lugar algum.

domingo, setembro 10, 2006

Passageira.

Nesta semana, sem temas que aprisionem a escolha dos vídeos aqui postados, comecemos com uma canção dos meus tempos de adolescência. Siouxsie and the Banshees e a animada The Passenger, música boa daquele velho jovem Iggy Pop.

Crônica Dominical

As janelas estão fechadas. Lá fora um renitente carro de som anuncia pela avenida as benfeitorias de algum postulante às nossas assembléias. Carros outros rasgam seus motores e correm. Aqui dentro a penumbra. O televisor me mostra os backhands e trejeitos de Maria Sharapova. Ouço no velho aparelho San Francisco (be sure to wear some flowers in your hair). Os cigarros acabaram. Certa aflição preguiçosa me toma. Cigarros são ainda companheiros nestas horas de escrever seja lá o que for. E na fumaça as idéias tendem a se materializar, se esvaindo por outras e outras e outras, numa sucessão que às vezes se atropela...

...permaneci a boiar por alguns minutos. Um tanto hipnotizado pelo silêncio que se fez de repente. Era o fim da canção. Outra surge. A singela We belong together. Há uma garrafa de Cutty Sark no armário, mas não me atrai sempre aquela ranhura na garganta. Nem mesmo sei como pode haver daqueles alcoólatras de cachaça barata. O estouro no peito me parece maior que o prazer da embriaguez. Mas se o uísque não me faz morrer de amores, a fumaça me acolhe desde os tempos de ficar em transe pelas fogueiras de minha infância. Cada um tem o seu jeito de desentortar um pouco. Alguns gostam de uma boa Skol, outros querem mais, colhem cogumelos e deles bebem um chá bem quente. Outros preferem o bolo de aipim que vendem no Wal-mart – que, se tem a seu favor o fato de não matar ninguém de overdose ou cirrose, tem um efeito que dura apenas o tempo da mordida. Dá-lhe bolo e sucessivas mordidas. O corpo perde a forma e a azia vem sempre forte...

...não há cigarros. Mas não chego a desesperar. Não é o vício, é a penumbra que os exige...

...o silêncio sempre vem. Há dias de não querer nada com a profundidade. Nem com as tristezas de toda hora. Há dias em que o silêncio vem, não nos permitindo idéias. É reparar o relevo das coisas. E nada mais.