sábado, março 31, 2007

Duas mãos.

Só tenho duas mãos. E felizmente as tenho. Mas são apenas duas. E conforme as limitações legadas ao ser humano, nada posso além de reclamar que me faltem outros braços. E como estou a escrever novamente Fenices, romance idealizado por mim há mais de uma década, nada posso fazer além de obedecer aos desígnios. Se me bateu a vontade de seguir adiante com o texto, infelizmente outras atividades estarão prejudicadas... Sobretudo este querido blog... Mas nada é para sempre... Em breve tudo se regulariza.

Como posso pensar em postagens se estou agora a escrever um romance que poderá, um dia, trazer-me algum elogio? E não é atrás de elogios que vive o artista?

sexta-feira, março 30, 2007

O chamamento.

Estive ausente deste blog por dois dias, mesmo contra a minha vontade de atualizá-lo com boa freqüência. Mas na quarta-feira, pela manhã, bateu-me uma irreconhecível vontade de voltar a seguir com um romance adormecido. Ano passado, meti-me a escrever os primeiros capítulos de certa história que idealizei há muitos anos. Quando surgiu-me um impasse, coisa comum nesta arte de inventar gente e aventuras, deixei o texto e as suas poucas 25 páginas em total esquecimento. Acidentalmente reecontrei o texto inacabado e me senti um tanto mais engenhoso para continuá-lo. Foram, em dois dias, dez páginas novas - e todo mundo que se mete a escrever sabe que, para dois dias, a média é bem interessante.

Trata-se de um chamamento, um raro chamamento, e eu não poderia ignorá-lo. Um dramaturgo que já se meteu com poesia naqueles tempos de cabeça fresca e muita fúria, que compõe das suas músicas tristes, que se envolve com tantas dispersões e tarefas (tal qual este blog), as quais acabam por me distanciar da composição de novos textos, não poderia nunca renegar um chamamento criativo...

No entanto, pessimista por natureza, sei que o meu envolvimento com o romance, cujo nome é Fenices, pode bem durar pouco, por ora, e eu volte a encará-lo daqui a alguns meses ou anos. Mas enquanto eu estiver inspirado, vendo na obra alguma qualidade, ou enquanto eu não me interromper em impasses complexos de narrativa e descrição, devo seguir adiante.

Cada página escrita, hoje, pode bem ser-me a salvação, amanhã. Um amigo, otimista, disse-me que terminarei o tal romance ainda este ano... Ora, o planejamento me leva a crer em aproximadamente 300 páginas! E mais o tempo de pesquisa e constantes ajustes! Acostumado mesmo aos textos de teatro, 40 ou 50 páginas, muitos diálogos, recortes e poucos personagens, vejo-me diante de uma hercúlea tarefa...

Mas vocês todos sabem, amigos de velhos tempos, ando irritado com o teatro e suas complicações humanas e financeiras. Ando irritado com o tipo de teatro fácil, desverbalizado, que anda nos palcos desta cidade. Ando irritado com os amigos atores/diretores/cenógrafos que tenho - todos envolvidos em projetos distantes, alheios a mim... Resta-me a proposta solitária de escrever um longo romance, dependendo tão somente da minha paciência para que a tal página 300 logo chegue.

Sou dramaturgo, por essência e devoção. Mas quando recebo um chamamento, respeito-o. Assim, é provável que este blog fique meio largado... não muito, naturalmente. Um sujeito inteligente deve se meter em tudo o que lhe pareça agradável, em produzir seja lá o que for. Mesmo que eu escreva um punhado grande de bobagens, por aqui, ainda desta forma estarei exercitando as minhas habilidades. Mesmo que o romance que ando a escrever jamais chegue aos leitores, ainda assim estarei exercitando a cabeça, dando-lhe o que pensar, o que arranjar.

Como sempre acreditei, cabeça vazia é convite à tolice.

quarta-feira, março 28, 2007

Jackson revigorado.


Conforme eu havia prometido, sigamos com um pequeno festival Mash up, em que canções tradicionais são transformadas, ganham nova roupa, versos ou sei lá mais o quê. Podem inclusive ganhar versos de outra canção, numa mistura que nem sempre convence. Quando convence, no entanto, diverte bastante. Abaixo, duas transformação em clássicos populares do grande artista que foi Michael Jackson... Comecemos com Rock with you, com a adição de Dangerously, Sexy and Promiscuous, da bela menina Nelly Furtado, cujo repertório é até razoável. E, em seguida, a maravilhosa Don't stop till you get enough vem alterada com a canção Tilt ya head back, com o rapper Nelly e a moça bonitinha de voz potente e repertório incompreensível Christina Aguillera.

Nota do autor: os vídeos foram retirados do Youtube. Uma pena.

terça-feira, março 27, 2007

Que digo?


Ando amofinado, entristecido e razoavelmente desgostoso com a lua. Espero que a lua cheia que chegará por estes dias me traga um ânimo um tanto mais encorajado. Infelizmente, além da poesia que nos entristece (e nos faz bem), há a vida e suas reais e efetivas tristezas. Por ora, Paolo Veronese - aqui e aqui.


19

Era uma tarde de... 1995. Talvez 1994 ou 1996. O que pouco importa, uma vez que já se passaram mais de dez anos e o mundo andou um tantinho de nada. Tanto faz, Mozart fez um rebuliço em minha vida, mostrou-me o que era arte afinal. (Ó mundo de ignorantes! Ó mundo de gente a esperar pelo fácil! Ó vida pequena! Que acontece a toda esta gente? Que se dá na cabeça de todos?... Como ouvir aquilo que se ouve por aí e deixar que Mozart seja apenas um nome vago e erudito? Mozart - e tão somente ele - poderia salvar o mundo de sua tão ridícula decadência!)

Mozart me era pouco familiar. Conhecia o óbvio ou um pouco menos. Eu havia passado por Schumann e Villa-Lobos, havia ouvido as big bands e toda a serena bossa-nova. Do rock já me desfiliara e muito acreditava na força dos monstros seculares, permitindo-lhes penetrar o dorso das idéias. Mas era bem certo que mesmo tão soberbamente tratados, meus ouvidos ainda não possuíam tudo. E numa tarde - uma quinta-feira, durante o intervalo de meu almoço na época em que trabalhava - ou fingia trabalhar - no IBGE, eis que Mozart e sua estupenda Sinfonia n.º 41, K. 451, conhecida por Jupiter, entraram em meus ouvidos. Era o fim da inocência, caro leitor. Ou o começo da real crítica pessoal. A consciência do pleno.

Creio até que alguém me considerará agora um "pavão desmedido" ou coisa que o valha. Mas seja lá como for, confesso que naquele momento eu tive uma das melhores sensações de toda a minha vida. Quando se percebe a força, a monstruosidade de um gênio - quando se esquece de toda a vida, de si mesmo até, para tão somente se dedicar a ouvir... a sentir os violinos de Mozart, sua vivacidade e inteligência... Ora! Sinto pena, com toda a sinceridade, sinto profunda pena de quem passa por toda uma vida, decádas e décadas, sem ter experimentado a mesma explosão de contentamento que tive ao conhecer tão sublime obra, a qual para sempre permaneceu afixada nos zumbidos e ecos dos meus dias.

Não me espanto se algum leitor desavisado pouca importância der a Mozart e ao que é mostrado nos vídeos abaixos. Desde cedo, quando era aquele nerd dandi a ouvir Noel Rosa e Duke Ellington, convivia com o escárnio de muita gente. Mas sempre que me tentavam ridicularizar - "ai! um garoto desta idade a ouvir velharias!" ou "olha lá o museu que passa!" - eu me entristecia e pensava " como há gente tonta neste mundo!"

Ocupando a 19ª posição entre as cem canções que mais me comoveram nesta vida de tanto desconserto, Mozart e o 1º movimento de sua Jupiter. E como eu mesmo desejarei ouvi-lá mais tarde, colocarei toda a sinfonia, com regência de Nikolaus Harnoncourt, o qual conduz a Filarmônica de Viena, no Suntory Hall, em Tokio, 2006.

Se uma única alma neste mundo puder ser salva com esta postagem, creio já ter cumprido uma maravilhosa tarefa. Ou que, ao menos, sirva de deleite a algum ouvido já abençoado.


Talvez alguém próximo a mim se lembre que eu já escrevi um drama (Índice Koechel), tão somente por ter me impressionado com o lirísmo de um quarteto de cordas (k. 512). Creio até que muitas e muitas foram as obras criadas com a boa parceria de Mozart, nestes últimos séculos.

segunda-feira, março 26, 2007

Mash up.

A semana terá um festival Mash Up. E para quem não sabe o que é exatamente um mash up, recomendo a visitação à postagem "Eleanores", publicada na última sexta-feira, e veja o último vídeo, uma mistura das mais inventivas. Comovido o bastante, achei interessante promover um pequeno festival, com tudo que eu encontrar e me parecer interessante. Quem souber de algo, que eu não sei - o que não é realmente difícil - favor fazer a devida indicação. Pra começar, um vídeo realmente muito bom, em que Jonathan King transforma canção de Aretha Franklin, Let It All Hang Out.

Outra interessante construção é a que une Snoop Dog e The one that I want, clássico com John Travolta e Olivia Newton-John, daquele bom musical Grease, dos anos 70.


domingo, março 25, 2007

Crônica Dominical

Não é a primeira vez - e nem será a última - que me pego confuso, sem saber exatamente o que fazer, sabendo apenas que preciso, conforme a integridade alardeada pelo bom senso, fazer qualquer coisa. E nem seria novidade dizer, mas digo, quase como a desabafar: como a vida é complicada! Como é difícil chegar a bom termo, em qualquer situação! Como é difícil levar as coisas como gostaríamos - se há tanto desencontro e confusão!

Mas o paradoxo que ainda pode consolar um escritor enfastiado é a percepção de que afinal a vida nem tem sido tão difícil - com possíveis tragicidades e limitações repentinas... "É um grande privilégio ter vivido uma vida difícil", dizia-nos, creio eu, Indira Gandhi. Mas qual é a dificuldade que pode fazer da vida então um passatempo saboroso? Ter fome? Sede? Ter alguma dor que não se extingüe? Sofrer aceleradamente de paixão e por ela perder o senso? Ora, dentro da minha débil sabedoria, nas gavetas de minhas infelicidades, sei apenas de uma dificuldade que ainda pode trazer benefícios justos: a inconformidade.

E mesmo que a minha reclamação nesta crônica pareça um devaneio existencialista, tenho mesmo dado com os burros n'água nos mais vis e vulgares desafios, embaralhando-me todo nos acertos fáceis, nos ajustes cotidianos, nos elementares prazos... Lembro-me de Albert Camus e sua sentença: "O significado da vida é a mais urgente das questões". Ora, como poderemos nos ater a tanto, se tanto temos de cumprir - cada tarefa, cada pagamento, imposto, despesa, rito, visita, resposta, consideração e apreço. É tanto o que se fazer que eu me vejo distante das tais urgências maiores, da busca pelas grandes e imprescindiveis verdades.

Não é a primeira vez que me vejo confuso, atabalhoado. Tento até provar da racionalidade, agir como criatura formada em ideais e ensinamentos acadêmicos. Tento ser honesto e maduro, objetivo e sensato. Tento mostrar a mim mesmo que aprendi já alguma coisa nestes anos todos. Mas acabo sempre me confundindo com as cores, me desconcentrando com cheiros e esbarrando em elevadas ou inúteis considerações. Vejo, afinal, que aprendi tão somente a ter mais dúvida, mais questionamento e menos simpatia às mesquinharias e máscaras.

Cada vez mais eu desaprendo. E me sinto perfeitamente normal, saudável, lúcido. Como se desaprender (ou perceber que o sabido era falso, quimera) fosse mesmo o único objetivo da existência.